Nesta terça-feira (14),
o The New York Times, um dos principais jornais estadunidenses,
publicou um artigo escrito pelo ex-presidente Lula em que ele pede o retorno da
democracia no país e diz estar sendo vítima de um julgamento injusto e parcial.
Confira na íntegra:
Do The New York Times
CURITIBA, Brasil - Dezesseis
anos atrás, o Brasil estava em crise; seu futuro incerto. Nossos sonhos de nos
transformarmos em um dos países mais prósperos e democráticos do mundo pareciam
ameaçados. A ideia de que um dia nossos cidadãos poderiam desfrutar dos padrões
de vida confortáveis de nossos colegas na Europa ou em outras democracias
ocidentais parecia estar desaparecendo. Menos de duas décadas após o fim da
ditadura, algumas feridas daquele período ainda estavam cruas.
O Partido dos Trabalhadores
ofereceu esperança, uma alternativa que poderia mudar essas tendências. Por
essa razão, mais que qualquer outra, vencemos nas urnas em 2002. Tornei-me o
primeiro líder trabalhista a ser eleito presidente do Brasil. Inicialmente, o
mercado financeiro se abalou; mas o crescimento econômico que seguiu
tranquilizou o mercado. Nos anos seguintes, os governos do Partido dos
Trabalhadores que chefiei reduziram a pobreza em mais da metade em apenas oito
anos. Nos meus dois mandatos, o salário mínimo aumentou 50%. Nosso programa
Bolsa Família, que auxiliou famílias pobres ao mesmo tempo em que garantiu que
as crianças recebessem educação de qualidade, ganhou renome internacional. Nós
provamos que combater a pobreza era uma boa política econômica.
Então este progresso foi
interrompido. Não através das urnas, embora o Brasil tenha eleições livres e
justas. Em vez disso, a presidente Dilma Rousseff sofreu impeachment e foi
destituída do cargo por uma ação que até mesmo seus oponentes admitiram não ser
uma ofensa imputável. Depois, eu fui mandado para a prisão, por um julgamento
questionável de acusações de corrupção e lavagem de dinheiro.
Meu encarceramento foi a
última fase de um golpe em câmera lenta destinado a marginalizar
permanentemente as forças progressistas no Brasil. Pretende-se impedir que o
Partido dos Trabalhadores seja novamente eleito para a presidência. Com todas
as pesquisas mostrando que eu venceria facilmente as eleições de outubro, a
extrema direita do Brasil está tentando me tirar da disputa. Minha condenação e
prisão são baseadas somente no testemunho de uma pessoa, cuja própria sentença
foi reduzida em troca do que ele disse contra mim. Em outras palavras, era do
seu interesse pessoal dizer às autoridades o que elas queriam ouvir.
As forças de direita que
tomaram o poder no Brasil não perderam tempo na implementação de sua agenda. A
administração profundamente impopular do presidente Michel Temer aprovou uma
emenda constitucional que estabelece um limite de 20 anos para os gastos
públicos e promulgou várias mudanças nas leis trabalhistas que facilitarão a
terceirização e enfraquecerão os direitos de negociação dos trabalhadores, e
até mesmo seu direito a uma jornada de oito horas de trabalho. O governo Temer
também tentou fazer cortes na Previdência.
Os conservadores do Brasil
estão trabalhando muito para reverter o progresso dos governos do Partido dos
Trabalhadores, e eles estão determinados a nos impedir de voltar ao cargo no
futuro próximo. Seu aliado nesse esforço é o juiz Sérgio Moro e sua equipe de
promotores, que recorreram a gravações e vazamentos de conversas telefônicas
particulares que tive com minha família e com meu advogado, incluindo um grampo
ilegal. Eles criaram um show para a mídia quando me levaram para depor à força,
me acusando de ser o “mentor” de um vasto esquema de corrupção. Esses detalhes
aterradores raramente são relatados na grande mídia.
Moro tem sido celebrado pela
mídia de direita do Brasil. Ele se tornou intocável. Mas a verdadeira questão
não é o Sr. Moro; são aqueles que o elevaram a esse status de intocável: elites
de direita, neoliberais, que sempre se opuseram à nossa luta por maior justiça
social e igualdade no Brasil.
Eu não acredito que a
maioria dos brasileiros aprove essa agenda elitista. É por isso que, embora eu
possa estar na cadeia hoje, eu estou concorrendo à presidência. E por isso que
as pesquisas mostram que se as eleições fossem realizadas hoje, eu venceria.
Milhões de brasileiros entendem que minha prisão não tem nada a ver com
corrupção, e eles entendem que eu estou onde estou apenas por razões políticas.
Eu não me preocupo comigo
mesmo. Já estive preso antes, sob a ditadura militar do Brasil, por nada mais
do que defender os direitos dos trabalhadores. Essa ditadura caiu. As pessoas
que estão abusando de seu poder hoje também cairão.
Eu não peço para estar acima
da lei, mas um julgamento deve ser justo e imparcial. Essas forças de direita
me condenaram, me prenderam, ignoraram a esmagadora evidência de minha
inocência e me negaram Habeas Corpus apenas para tentar me impedir de concorrer
à presidência. Eu peço respeito pela democracia. Se eles querem me derrotar de
verdade, façam nas eleições. Segundo a Constituição brasileira, o poder vem do
povo, que elege seus representantes. Então, deixe o povo brasileiro decidir. Eu
tenho fé que a justiça prevalecerá, mas o tempo está correndo contra a
democracia.
Luiz Inácio Lula da Silva
Fonte: http://institutolula.org/artigo-de-lula-no-the-new-york-times-eu-quero-democracia-nao-impunidade
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