CURSO
DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO EDUCACIONAL ALFA
O ENSINO DE HISTÓRIA DURANTE A DITADURA MILITAR
MOISÉS DE PAULA RODRIGUES
CARATINGA
2015
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO
EDUCACIONAL ALFA
O
ENSINO DE HISTÓRIA DURANTE A DITADURA MILITAR
MOISÉS
DE PAULA RODRIGUES
Dissertação
apresentada à Coordenação do curso de pós-graduação de Ensino de História, da
Pontifícia Universidade à Uniandrade, como requisito parcial para a obtenção do
Grau de pós-graduado.
CARATINGA
2015
Sumário
Resumo
Este
trabalho acadêmico tem como finalidade discorrer sobre os mecanismos adotados
pelo governo militar no sentido de concretizar a manipulação ideológica,
empregando métodos específicos no sistema educacional, mais precisamente no
ensino de história. Além disso, foi realizado um debate concernente aos
decretos-leis criados objetivando modificar a funcionalidade da disciplina com
o intuito de viabilizar a formação de uma geração caracterizada pela postura
acrítica diante dos acontecimentos políticos. A deficitária formação dos
professores, juntamente com medidas arbitrárias e repressoras contribuiu para
orquestrar um aparelho de governo onde inexistia um espaço para contestação e
debates acerca do regime militar. Na tentativa de promover a manipulação diante
do sistema de ensino, os materiais oferecidos aos discentes, mais precisamente
os livros didáticos, possuíam um conteúdo marcado pela exaltação de grandes
líderes do passado, uma história onde os principais fatos eram narrados de uma
maneira amorfa e os valores patrióticos eram abordados incisivamente. Qualquer
manifestação contrária ao que estava sendo perpetrado pelo governo era
reprimida pelos órgãos dirigentes, dentro dos princípios da Doutrina de
Segurança Nacional. Inexistia um espaço substantivo para o debate e o
desenvolvimento do pensamento crítico entre o corpo discente e, os professores,
sobremaneira, eram sumariamente surpreendidos por movimentos hostis por parte
do governo militar. Por fim, a presente pesquisa apresentará os desdobramentos
do golpe civil-militar e suas consequências nas instituições de ensino e
precisamente na disciplina história.
Introdução
O presente trabalho tem como
objetivo analisar os mecanismos adotados pela ditadura militar no sentido de
modificar o sistema educacional e, precisamente o ensino de história,
estabelecendo normas e princípios com o intuito de legitimar o regime político
vigente. O impacto gerado na educação após o golpe civil-militar foi abordado
de uma forma sistemática, cuja repercussão foi visível em todas as áreas da
produção de conhecimento.
O segundo capítulo da pesquisa
realizou um debate sobre a metodologia aplicada ao ensino de história. A
perspectiva positivista foi adotada de uma maneira sistemática durante governo
autoritário, cuja aplicação era desprovida de criticidade e sem um
posicionamento de contestação diante dos acontecimentos vivenciados. Além
disso, em seu percurso até se estruturar como disciplina acadêmica, a história
passou por diversos problemas quanto a sua funcionalidade e autenticidade
científica.
Vale enfatizar que, no decorrer da
pesquisa, foram abordados os mecanismos adotados no sentido de utilizar o
sistema educacional, mais precisamente o ensino de história, como elemento
essencial no sentido de se efetivar a manipulação ideológica. Deve-se enfatizar
que houve uma abordagem sistemática sobre os decretos-leis criados com a
finalidade de se instrumentalizar a manipulação e o controle sobre as
diretrizes curriculares das instituições de ensino.
O regime político caracterizado como
uma ditadura, que teve início no Brasil em abril de 1964, desarticulou os
movimentos de liberdade de expressão e luta pela igualdade de direitos sociais
e civis. A sociedade se deparou com um fenômeno político marcado pelo controle
absoluto dos meios de comunicação e ausência de alternância do poder público.
Durante vinte e um anos a população perdeu seus direitos fundamentais, como de
se expressar livremente diante dos fatos acorridos no momento.
Diante da repressão política, a
ditadura militar modificou o sistema educacional com a finalidade de efetivar a
manipulação e associar a imagem do governo a noções como progresso,
desenvolvimento e avanço na qualidade de vida da sociedade. Com isso, a
história passou por um processo de desarticulação de sua funcionalidade,
voltada para o posicionamento crítico diante dos acontecimentos políticos.
Por fim, foi realizada uma discussão
concernente às características dos livros didáticos adotados durante o período
de vigência da ditadura militar. O conteúdo do livro, voltado para a exaltação
de grandes líderes do passado, foi discorrido associando o fato com a
finalidade de se concretizar a manipulação concretizada na educação.
Diante
de uma perspectiva contextualizada, a história do ensino de história passou por
diversas fases em sua fundamentação teoria e metodológica. Já na esfera do
poder político constituído, a disciplina foi comumente utilizada com a
finalidade de manter a ordem social vigente, como manobra no sentido de
implantar uma ideologia e atender interesses particulares.
No caso específico do Brasil, a
história enfrentou diversos empecilhos em sua trajetória até se consolidar como
disciplina, com grade curricular definida. Autoridades representantes do poder
público defendiam a ideia de que a história não era considerada uma ciência,
mas tão somente uma área do conhecimento desprovida de caráter científico,
impossibilitando, sobremaneira, a sua implantação no sistema educacional.
Vale enfatizar que os princípios
positivistas provocaram a desarticulação do ensino de história. Em outras
palavras, a narração linear dos fatos, a biografia dos grandes líderes da nação
e a enumeração acrítica dos principais acontecimentos do país; contribuíram
para associar a história à noção de disciplina desprovida de embasamento
técnico-científico.
Entretanto, ainda no período
regencial, após a criação do colégio D. Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro,
a história foi incorporada à grade curricular do corpo discente a partir da
sexta série. Porém, o material oferecido
aos professores não era traduzido para o português, obrigando-os a recorrer ao
conteúdo francês para ministrarem suas aulas.
Outro obstáculo encontrado
concernente à implantação da história como disciplina acadêmica
consiste na oposição sistemática de autoridades do poder constituído. Um
exemplo dessa oposição foi do senador paulista Paulo Egídio de Oliveira que
afirmou:
“A História não
é uma ciência, senão, eu pergunto: qual a sua fenomenologia? A História não tem
fenômenos, ou, por outra, todos os fenômenos pertencem à História, que é a
trama que serve para prova de todos os conhecimentos humanos de todas as
ciências. (...) Frente a tantos e variáveis caminhos que se lhe apresentavam,
não conseguindo identificar um caminho a seguir ou oferecer uma sugestão
alternativa, e o que era para ele de extrema importância- “um método
positivo”-, preferiu optar pela não introdução da História da Civilização no
Estado de São Paulo, como parte do programa do ensino público”.[1]
Contudo, algumas transformações
foram instrumentalizadas em meados de 1920, principalmente com a escola dos
annales francesa. A importância do movimento referido consiste em sua
reformulação metodológica e ampliação do objeto de estudo da história, atribuindo-lhe
uma fundamentação científica consistente. Vale ressaltar que áreas como
filosofia, sociologia, antropologia, arqueologia, dentre outras, foram
comumente empregadas no sentido de aprofundar o estudo de história e essenciais
no sentido de conceder um suporte ao objeto de estudo.
Com isso, métodos científicos,
adotado pelos franceses, como a história oral, a história quantitativa, a
história iconográfica elevaram a disciplina fundamentalmente como uma área do
conhecimento, com um aparato científico peculiar. Dessa forma, a história
alcançou passou a ser vista como uma importante ferramenta no sentido de
compreender o comportamento humano na sociedade em que está inserido e sua
capacidade modificadora da mesma. Ou seja, os historiadores passaram a ser caracterizados
como críticos contundentes do sistema político-ideológico estabelecido.
Portanto, essa postura crítica
diante de fatos vivenciados no cotidiano, provoca incomodação nas autoridades
do poder público constituído. Todavia, deve-se enfatizar que a história passou
a ser considerada uma importante ferramenta no sentido de se implantar valores
e ideais de uma forma vertical, ou seja, de uma maneira hierarquizada. O
mecanismo incorporado pelos órgãos dirigente é modificar as diretrizes
impetradas no sistema educacional, utilizado como um instrumento essencial na
manutenção do regime político outorgado.
Capítulo 2: O ensino de história
durante a ditadura militar
Em abril de 1964 teve início um
período na história do Brasil marcado pela repressão e falta de liberdade de
expressão. Utilizando o argumento de um suposto projeto dos comunistas,
liderados pelo presidente João Goulart, de tomar o poder, os militares
instalaram um novo modelo político no país, tendo o amparo de setores
dirigentes da nação. Mediante um golpe civil-militar, orquestrado pelos setores
conservadores do país, o presidente constitucionalmente eleito, Jango (como era
conhecido pelas camadas populares), foi expulso do cargo e, a posteriori,
exilado na Argentina.
Após a concretização do golpe, os
militares projetaram um aparato de governo caracterizado pela hierarquização e
ausência de participação popular no governo. Objetivando estabelecer a ordem no
país e expulsar os comunistas, considerados subversivos, foi criado a DSN (Doutrina
de Segurança Nacional). Inspirado em princípios norte-americanos, a função de
tal doutrina consistia em proteger o país diante do “perigo” representado pela
figura dos comunistas.
A partir dos fatos ocorridos em
1964, os militares sistematizaram uma série de mecanismos no sentido de
proteger o regime político estabelecido. Além disso, iniciou-se a disseminação
de noções de nacionalismo e patriotismo veiculado nos meios de comunicação,
associando a imagem do governo à modernização e industrialização. Variados
instrumentos propagandísticos foram criados com a finalidade de manipular a
opinião pública a favor do governo.
Com a finalidade de incrementar o
desenvolvimento econômico do país, considerado predominantemente agrário, o
governo criou uma série de medidas no sentido de aumentar a escolaridade da
população. Porém, deve-se destacar que o Estado assumiu o compromisso de
incentivar a industrialização, investindo, sobremaneira, em cursos
profissionalizantes e na preparação técnica de mão de obra que atendesse à
demanda. Existia a preocupação em diminuir a procura pelos cursos superiores e
aprimorar a formação técnica voltada para a industrialização.
Perceberam que para realizarem suas
intenções era necessário aumentar o grau de escolaridade da população, sem, no
entanto, aumentar a procura pelo já sufocado ensino superior. A fórmula
encontrada para evitar esse aumento da demanda foi adotar a partir de 1969 a
exigência do vestibular para que houvesse o ingresso na Universidade. Para
evitar o aumento da demanda das vagas universitárias teriam que incentivar a
formação profissional já em nível do ensino médio através da instituição e
incentivo do ensino profissionalizante, proporcionando assim, a opção de
finalização dos estudos, mas com uma formação profissional definida e
valorizada. [2]
O regime militar utilizou o sistema
de ensino intensamente com o objetivo de orquestrar a manipulação ideológica e
promover a aceitação do governo diante das classes sociais. Vale enfatizar que
o sistema de ensino foi reformulado em consonância com a Doutrina de Segurança
Nacional. Em outras palavras, o corpo discente entrava em contato com um
conteúdo caracterizado pelas distorções e sistematicamente voltado para a
modificação da imagem do Estado.
No que concerne ao ensino de
história especificamente, deve-se ressaltar que a disciplina passou por um
processo de reformulação metodológica, tendo como finalidade inviabilizar o
desenvolvimento do senso crítico e a capacidade de contestar o sistema político
vigente. Os princípios positivistas foram sistematizados e implantados nos
currículos e programas de ensino. A narração de acontecimentos e a biografia de
grandes heróis foram aspectos marcantes nos materiais dispensados aos alunos,
culminando numa nítida defasagem em seu processo de ensino-aprendizagem.
A educação teria
papel importante nesse sentido, ela teria que ser formadora de mão-de-obra para
o setor industrial sem a necessidade de formar cidadãos críticos a ponto de
poderem contestar as decisões governamentais. Por isso, não haveria a
necessidade das ciências humanas formadoras de senso crítico. Pois gerava uma
negação de conteúdo crítico na formação geral do educando. Em relação à negação
da formação geral ao educando, Selva Guimarães Fonseca nos coloca essa questão
afirmando que o objetivo seria proporcionar uma educação que levasse em conta
os ideais do Conselho de Segurança Nacional cujo objetivo era controlar e
reprimir as opiniões a fim de evitar ou eliminar qualquer resistência ao regime
autoritário em vigor. [3]
As diretrizes curriculares adotadas durante a
ditadura militar tinham como finalidade promover o avanço da industrialização
em detrimento da formação humana integral do corpo discente. As áreas humanas, responsáveis
pelo desenvolvimento do pensamento crítico, foram desarticuladas e os docentes
passaram a sofrer perseguição. Ou seja, o mecanismo repressivo adotado pelo
governo empreendeu medidas de combate a movimentos considerados contrários à
ordem previamente estabelecida. O corpo docente passou a ter que obedecer a
hierarquia dos poderes e a ordem pública, seguindo os princípios norteadores da
DSN.
No
dia 18 de abril de 1969 foi criado o decreto-lei nº 547 que autorizou o
funcionamento e organização dos cursos de licenciatura curta. Com isso, os
professores concluíam sua formação acadêmica em menos tempo com relação às
outras áreas (principalmente técnicas). Como consequência imediata, os docentes
tiveram uma defasagem significativa em seu processo formativo, perdendo a
capacidade de se posicionar criticamente diante dos acontecimentos políticos.
Os
professores de história, disciplina caracterizada pela criticidade, tornaram-se
meros transmissores de conhecimento, ou seja, perderam sua capacidade de contestação.
Em outras palavras, os docentes assumiram uma posição de “proletários da
educação” e, sobremaneira, os alunos não passavam por um processo formativo
crítico, tornando-se cidadãos passivos diante dos acontecimentos.
No início do ano
de 1969, amparado pelo Ato Institucional nº5, de dezembro de 1968, o governo,
através do Decreto-lei nº547, de 18 de abril de 1969, autoriza a organização e
o funcionamento de cursos profissional superiores de curta duração. Ao admitir
e autorizar habilitações intermediárias em nível superior para atender às
“carências do mercado”, o Estado revela ser desnecessária uma formação longa e
sólida em determinadas áreas profissionais, quais sejam, as licenciaturas
encarregadas de formar mão-de-obra para a educação. “Enquanto isso, outras
áreas de formação profissional mantiveram os mesmos padrões de carga horária e
duração”. [4]
Um dos mecanismos adotado pelo governo
militar foi a implantação dos Estudos Sociais na grade curricular dos alunos
que, de uma maneira superficial, formava em apenas um ano e meio os chamados
“professores polivalentes”. Dessa forma, os professores eram habilitados a
ministrarem aulas de história e geografia. A finalidade do governo autoritário
com tal medida consistia na tentativa de ajustar o indivíduo à ordem,
tornando-o submisso diante do autoritarismo impetrado no governo do período. A
consequência da aplicação dos Estudos Sociais foi a formação de professores
incapacitados para exercerem suas função de uma maneira qualificada e,
sobremaneira, houve um nítido prejuízo no processo de ensino aprendizagem do
corpo discente.
Vale enfatizar que a lei 5692/71,
criada pelos órgãos dirigentes da ditadura militar, concedeu ao governo a
exclusividade na elaboração do currículo de formação dos professores. Com isso,
o processo de aprendizagem dos professores era permeado por uma metodologia
positivista, que ressaltava os grandes heróis da nação, uma narração linear de
fatos considerados relevantes e uma postura acrítica e amorfa dos docentes e
discentes diante dos objetos de estudo.
Esse processo, caracterizado pela perseguição
e repressão dos órgãos dirigentes do governo, foi responsável pela formação de
uma geração conhecida como “deixa para lá”, ou seja, inexistia, por parte dos
estudantes e professores, um posicionamento contestatório diante das medidas
arbitrárias do Estado. Portanto, o sistema educacional foi um instrumento
eficaz no processo de manipulação da grande massa e da produção de
conhecimentos, que exaltava os feitos do governo e forjava um passado glorioso
e sem representatividade diante das camadas sociais.
“O programa
curricular imposto durante o Regime Militar, com a Reforma do Ensino de 1971
impunha um Ensino diretivo, acrítico, no qual a História aparecia como uma
sucessão linear de fatos considerados significativos, predominantemente
políticos e militares, com destaque para os “grandes nomes”, os espíritos
positivos que conduzem a História”. [5]
Uma das peculiaridades do sistema de
ensino do período, mais precisamente do ensino de história, foi a elaboração de
um currículo voltado para despertar o sentimento patriótico na nação. Noções
como nacionalismo e civismo, que faziam parte do quadro diretivo da DSN, eram
vinculadas nas escolas e programas educacionais. Vários desfiles e
manifestações de amor à bandeira nacional eram organizados periodicamente com a
finalidade de promover o amor e respeito ao país.
O corpo discente era controlado e
manipulado intensamente, pois, juntamente com o aparato propagandístico
orquestrado pelos militares, o sistema de ensino era sistematiza com a
finalidade de promover a imagem do governo. Vale ressaltar que os slogans do
período, como “Brasil, ame-o ou deixe-o”, “Ninguém segura este país”, dentre
outros, faziam parte de um aparato que, juntamente com a cultura e educação,
consistia em associar a ditadura militar a noções como progresso,
desenvolvimento e avanço social.
Portanto, o objetivo do governo era,
sobremaneira, inserir no aluno a noção de magnificência da pátria e limitar os
questionamentos inerentes à situação do país. Os discentes não podiam
desenvolver nenhum pensamento crítico diante da situação em que se encontravam,
pois estavam inseridos num sistema em que eram forçados a obedecer a hierarquia
dos poderes. O programa curricular do curso de história da rede pública de
ensino era uma ferramenta fundamental no sentido de legitimar as ações do
governo.
Vale enfatizar que a sociedade viveu
um período marcado pela perseguição e repressão em todas as esferas da sociedade
civil. Além do controle dos meios de comunicação, os estudantes e professores
eram sumariamente vigiados. Qualquer manifestação apontada como subversiva era
investigada e os responsáveis acusados de ameaçarem a ordem nacional. A
Doutrina de Segurança Nacional servia como uma ferramenta no sentido de
aprimorar o controle total sobre os intelectuais e estudantes do país.
“A ditadura implantada com o movimento
militar de 1964 desfechou também um golpe nas diferentes experiências de
ensino. Escolas fechadas, professores e alunos presos e respondendo a
processos-crimes foram algumas das formas usuais de tratamento por parte dos novos
donos do poder”. [6]
Enfim,
a disciplina de história, como parte integrante do sistema de ensino, pode ser
apontada como uma ferramenta essencial no processo de manipulação do pensamento
e do senso crítico da sociedade. O programa de ensino ofertado durante o
período foi orquestrado para despertar no corpo discente o sentimento de
nacionalismo e de valorização da pátria. A população, acostumada com a
manipulação, não despertava para a real situação em que se encontravam.
Capítulo 3: Os materiais didáticos
dos alunos durante a ditadura militar.
O presente capítulo tem como
objetivo analisar as peculiaridades do material dispensado aos alunos durante a
ditadura militar. Além disso, foi realizada uma abordagem concernente às
características do material, suas intenções, anseios e aspirações. O foco girou
em torno dos conteúdos presentes nos livros didáticos, ofertados aos alunos do
sistema público de ensino.
Antes de chegar aos alunos, os
livros didáticos passavam por um processo de análise por parte dos órgãos
dirigentes. Em outras palavras, o conteúdo presente nos materiais ofertados aos
discentes passava por uma meticulosa análise, cuja finalidade era aferir se
havia mensagens de caráter subversivo.
Com isso, os livros de história eram
elaborados somente para exaltar os grandes feitos do passado, uma narração
linear e acrítica dos acontecimentos. Os alunos decoravam perguntas e respostas
e interagiam com textos tendenciosos, modificando fatos importantes do país com
a finalidade de atender interesses particulares.
O método mais preciso, dentro do
interesse desse regime era o controle, através desse, poder-se-ia construir uma
nação de acordo com os propósitos de quem estava no poder, no caso desse estudo
os militares. O controle é uma forma de manter a ordem para evitar
insurreições. Era preciso controlar, e uma das formas desse processo era
através dos livros didáticos que uniformizavam o ensino dentro das intencionalidades
do governo. [7]
Os discentes passavam por um
processo de ensino-aprendizagem caracterizado pela defasagem e sem um senso
crítico aprofundado. Vale enfatizar que os recursos iconográficos eram
sumariamente utilizados pelos autores dos livros, associando noções de amor à
bandeira e à pátria brasileira. Ou seja, o nacionalismo era uma ferramenta
utilizada constantemente ao se elaborar um livro didático, exaltando o respeito
e a cidadania. A finalidade do regime militar era tão-somente garantir a
manutenção da ordem, controlando com rigor todas as camadas da sociedade.
Com a finalidade de legitimar o
regime político vigente, nos livros didáticos continham textos relatando a
ameaça comunista. Os golpistas de 1964 eram caracterizados como salvadores da
nação, cuja missão seria resgatar o país dos comunistas ateus, que estavam
propícios a tomar o poder e destruir a família brasileira. Inexistia um espaço
adequado para o debate e o respeito ao pensamento crítico e epistemológico, ou
seja, os alunos não podiam debater sobre os fatos apresentados.
A preservação da segurança e da
ordem, baluartes da Doutrina de Segurança Nacional, eram noções indispensáveis
dos materiais oferecidos aos discentes. O sistema de ensino foi construído com
a finalidade de atender aos interesses privados do grupo que ocupava o poder de
uma forma ilegal. Por isso, o patriotismo deveria ser abordado com os alunos de
uma maneira incisiva, controlando todo movimento de subversão e de ameaça à
ordem estabelecida.
Outra estratégia adotada pelos
militares consistia na associação com princípios religiosos. Em outras palavras,
os livros didáticos abordavam textos de caráter religioso, cujo objetivo era
condicionar a postura dos alunos à princípios inerentes à religião, evitando,
sobremaneira, o surgimento de movimentos classificados como subversivos e
nocivos à ordem e à estrutura familiar.
Por isso,
incorporar conteúdos relacionados à moral nos livros didáticos foi uma das
maneiras encontradas pelos militares em manter a ordem no país e assim se
manterem no poder. Para eles a moral de uma pessoa estava relacionada com as
suas ações, portanto, era importante enfatizar a relação com Deus, porque se
enquadrando numa religião evitava-se o mal. Saber quais eram seus deveres
perante a sociedade, manter-se dentro da moralidade, buscando Deus, evitava,
segundo as pessoas que estavam no poder, manifestações críticas da população
com relação ao governo/conduta dos militares, pois a moral diz respeito a
seguir normas, enquanto a ética é o próprio questionamento moral. [8]
Enfim, as cartilhas, documentários,
livros didáticos, dentre outros materiais ofertados aos alunos, faziam parte de
um aparato orquestrado com a finalidade de promover a legitimação do golpe
militar de 1964, que retirou o presidente eleito democraticamente da
presidência. Para concretizar tal objetivo, os militares iniciaram um processo
de transformações do sistema educacional, mais precisamente do ensino de
história, disciplina conhecida pelo posicionamento crítico diante do cenário
político vigente.
Deve-se ressaltar que uma série de
métodos e práticas pedagógicas foram impostos aos docentes, além de vários
decretos-leis que objetivavam outorgar a manipulação e o controle exercidos
sobre a produção de conhecimento. A formação do professor e o seu desempenho em
sala de aula foram significativamente afetados, mediante o controle total sobre
a conduta dos profissionais de ensino. E, por outro lado, os alunos tinham uma
formação cognitiva incompleta e desprovida de subsídios críticos diante da
sociedade que o cercava.
Conclusão
Um dos mecanismos consistentes de
manipulação da grande massa e instrumento fundamental de controle da produção
de conhecimentos epistemológicos é o sistema de ensino. Diante de uma
metodologia específica, moldada segundo os interesses dos dirigentes do país, a
educação é controlada sistematicamente no sentido de modificar a imagem do
governo.
Com a implantação do golpe militar
de 1964, os militares orquestraram um aperfeiçoado aparato no sentido de
legitimar o regime político vigente. Os valores patrióticos e nacionalistas, em
simbiose com noções religiosas, foram transmitidos aos discentes através dos
materiais didáticos oferecidos. Diante de tal perspectiva, a imagem do governo
militar foi manipulada sumariamente.
Além disso, o processo de
ensino-aprendizagem dos alunos era incompleto e caracterizado pela ausência de
debates e posicionamento crítico diante dos acontecimentos. Os dispositivos
constitucionais orquestrados pelos militares promoveram a completa manipulação
diante dos sistemas de ensino. Por um lado, os professores passavam por uma
formação desprovida de uma pedagogia epistemológica e, em contrapartida, os
discentes não desenvolviam um pensamento de contestação diante dos
acontecimentos.
Diante de uma perspectiva
pedagógica, o ensino de história passou por problemas inerentes ao seu conteúdo
programático. Em outras palavras, a narração sucessiva dos acontecimentos
considerados relevantes, a biografia dos grandes heróis da nação e as
atividades decorativas ofertadas aos alunos, provocou uma desarticulação do
verdadeiro objetivo da história considerada uma disciplina acadêmica. Os ideais
propagados pelos militares foram perpetrados no sistema de ensino,
principalmente no que concerne aos objetos de estudo da história.
No que diz respeito aos materiais
ofertados aos profissionais da educação, deve-se ressaltar que as instituições
de ensino eram moldadas em conformidade com os princípios outorgados pelo
militares. Manifestações patrióticas eram preparadas nas escolas com a
finalidade de valorizar o nacionalismo e os sentimentos de amor à nação. Além
disso, havia a associação entre a religião e os valores fundamentais da
construção da cidadania dentro dos parâmetros da DSN. Qualquer movimento
considerado subversivo era sumariamente investigado pelos órgãos repressores e,
os intelectuais e estudantes, controlados de uma forma incisiva.
Bibliografia
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação. 2. ed. rev. e
atual. São
Paulo:
Ed. Moderna, 1996, 255 p.
BRASIL.
Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional. Lei nº 5692, de 11 de agosto de
1971. Pedagogia em foco. Disponível
em: Acesso em: 15 abril 2014.
CHAUI.
Marilena. Convite a Filosofia. 12
ed. São Paulo: Ed Atica, 2002.
FONSECA,
Selva Guimarães. Caminhos da história
ensinada. Campinas: Papirus, 1993.
GERMANO,
J.W. Estado militar e educação no
Brasil (1964-1985). São Paulo: Cortez; Campinas: Unicamp, 1993.
LIMA
E FONSECA, Thais Nívia de. O ensino de História do Brasil: concepções e
apropriações do conhecimento histórico (1971-1980). In: CERRI, Luiz Fernando
(org). O Ensino de História e a Ditadura Militar. 2ª ed. Aos Quatro Ventos,
2007.
MARTINS,
Maria do Carmo. Currículo, cultura e ideologia na ditadura militar brasileira:
demarcação do espaço de atuação do professor. In: CERRI, Luiz Fernando. (org).
O Ensino de História e a Ditadura Militar. 2ª ed. Aos Quatro Ventos, 2007.
NADAI,
Elza. O Ensino de História no Brasil: trajetória e perspectiva. Revista
Brasileira
de História. Vol. 13, nº 25/26. São Paulo: AMPUH/Marco Zero, 1993.
ROMANELLI,
Otaíza de Oliveira. História da
educação no Brasil: 1930 - 1973. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
SCHIMIDT,
Maria A. e CAIINEL, Marlene. Ensinar
história. São Paulo: Scipione, 2004.
[1] GERMANO, J.W. Estado
militar e educação no Brasil (1964-1985). São Paulo: Cortez; Campinas: Unicamp,
1993, pág. 76
[2]
ROMANELLI,
Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil: 1930 - 1973. 14. ed.
Petrópolis: Vozes, 1991. Pág. 267.
[5]
LIMA E
FONSECA, Thais Nívia de. O ensino de História do Brasil: concepções e
apropriações do conhecimento histórico (1971-1980). In: CERRI, Luiz Fernando
(org). O Ensino de História e a Ditadura Militar. 2ª ed. Aos Quatro Ventos,
2007. Pág. 57
[6]
NADAI,
Elza. O Ensino de História no Brasil: trajetória e perspectiva. Revista Brasileira
de História. Vol. 13, nº 25/26. São Paulo: AMPUH/Marco Zero, 1993.
[7]
CHAUI.
Marilena. Convite a Filosofia. 12 ed. São Paulo: Ed Atica, 2002. Pág.
440
[8] SCHIMIDT, Maria
A. e CAIINEL, Marlene. Ensinar
história. São Paulo: Scipione, 2004.
Nenhum comentário:
Postar um comentário