O
fim da ditadura militar veio acompanhado por um desejo de mudança: os
brasileiros desejavam a construção de um novo país – sem autoritarismo, sem
corrupção, sem inflação, sem concentração de renda, sem arrocho salarial, sem
injustiças sociais.
Em
um país ansioso por mudanças, José Sarney, o vice-presidente eleito em 1985,
assumiu a presidência, em decorrência da morte de Tancredo Neves, com a tarefa
de conduzir a transição da ditadura para o regime democrático.
José Sarney e Tancredo Neves. |
O
Congresso Nacional revogou leis criadas durante o regime militar, acabou com a
censura aos meios de comunicação e restringiu aos cidadãos brasileiros o livre
exercício de expressão e pensamento. O movimento sindical também adquiriu
liberdade de atuação, o que levou à criação de centrais sindicais. Foi
instituída, ainda, a liberdade de organização partidária, incluindo a
legalização dos partidos comunistas. Em termos de transição democrática, o
governo Sarney cumpria suas obrigações.
A
Nova República se deparou com uma pesada herança do regime militar: uma enorme
dívida externa de cerca de 100 bilhões de dólares. Sem alternativas, em 1987, o
governo decretou moratória; ou seja, tomou a decisão unilateral de não pagar a
dívida. No ano seguinte, ela foi renegociada com o Fundo Monetário
Internacional (FMI).
Outro
problema era a inflação. Em março de 1985, quando Sarney tomou posse, ela era
de 12,7% ao mês. Os trabalhadores eram os mais prejudicados, pois o salário
recebido perdia parte de seu poder aquisitivo já no dia seguinte.
Para
enfrenta-la, o governo recorreu a planos de estabilização, chamados de choques
econômicos. O primeiro foi o Plano Cruzado. Adotado em 1986, ele “congelava” os
preços de mercadorias, aluguéis, salários, tarifas públicas e passagens pelo
prazo de um ano, além de substituir a moeda do país, que era então o cruzeiro,
pelo cruzado.
O
efeito imediato foi o desejado: uma brusca queda da inflação. Com isso os
índices de popularidade de Sarney se elevaram. Aproveitando-se do enorme apoio
social, o presidente chegou a convocar os brasileiros pela televisão para
ajudar na fiscalização do congelamento dos preços.
Em
poucos meses, contudo, o Plano Cruzado começou a desmoronar. Primeiro, houve o
desabastecimento (ausência de oferta de mercadorias nas lojas), depois, o
chamado ágio (a cobrança de um preço maior do que o tabelado por mercadorias
vendidas clandestinamente). No segundo semestre de 1986, o plano chegou ao
limite. Ainda assim, dada a proximidade das eleições legislativas e estaduais,
marcadas para novembro, Sarney manteve o congelamento dos preços.
Apostando
no sucesso do Plano Cruzado e apoiando Sarney, os brasileiros votaram em peso
no PMDB, o partido do governo, que elegeu a maioria dos governadores, deputados
e senadores.
Passados
apenas cinco dias das eleições, Sarney autorizou o reajuste dos preços e dos impostos.
Temendo novos congelamentos, os empresários aumentaram os preços das
mercadorias. Os combustíveis, por exemplo, chegaram a ficar 60% mais caros.
Os
índices de popularidade do presidente despencaram. A inflação voltou, e os
salários novamente perderam parte de seu poder aquisitivo. Greves e
manifestações de protesto ocorreram em várias cidades. Em uma delas, na
Companhia Siderúrgica Nacional, o enfrentamento entre operários e soldados do
Exército resultou na morte de três grevistas.
Em
meio à crise econômica, intensificavam-se os conflitos sociais. No campo, os
enfrentamentos entre proprietários rurais e trabalhadores sem terra aumentaram.
Latifundiários se organizaram na União Democrática Ruralista (UDR), enquanto
trabalhadores rurais formaram o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra
(MST). Atentados – a mando ou não de latifundiários – contra líderes
camponeses, padres e sindicalistas tornaram-se comuns.
Para
a consolidação da transição democrática, restava ainda a tão aguardada eleição
presidencial: os brasileiros não elegiam presidente da República pelo voto
direto havia quase 30 anos.
As
esquerdas apresentaram seus candidatos. O do Partido dos Trabalhadores (PT), na
época identificado com um projeto socialista, era Luiz Inácio Lula da Silva. O
Partido Democrático Trabalhista (PDT) apresentou a candidatura de Leonel
Brizola, herdeiro do projeto trabalhista anterior a 1964.
Contudo,
as pesquisas foram rapidamente lideradas por um candidato quase desconhecido:
Fernando Collor de Mello (Partido da Reconstrução Nacional - PRN). Collor havia
feito carreira política no partido da ditadura e ganhara visibilidade no
governo de Alagoas, especialmente após o corte de altos salários da máquina
administrativa do Estado, o que o fez ficar conhecido como “caçador de
marajás”.
Collor
recebeu o apoio de grupos econômicos poderosos e também da mídia quando subiu
nas pesquisas e se mostrou capaz de derrotar Lula e Brizola nas eleições.
Em
suas campanhas, Lula defendia a anulação da dívida externa e a reforma agrária;
Brizola, por sua vez, ressaltava a necessidade de preservar as empresas
estatais e realizar amplos investimentos em educação; já Collor pregava a
modernização do país e a sua entrada no Primeiro Mundo. Collor soube aproveitar
o desejo de mudança que tomara a sociedade brasileira logo após o fim da
ditadura.
Como
resultado, ele obteve 28, 52% dos votos, contra 16,08% alcançados por Lula no
primeiro turno das eleições – o que os levou para o segundo turno, como
determinava a nova Constituição.
Contando
com o apoio de amplos setores da sociedade, sobretudo dos conservadores, Collor
venceu as eleições com 42,75% dos votos. Lula, em torno do qual se uniram as
esquerdas e as forças consideradas progressistas, recebeu 37,86% dos votos.
Fernando
Collor de Mello assumiu a presidência em 15 de março de 1990. Já no dia
seguinte, anunciou um novo plano de estabilização econômica para o país, cuja
inflação atingia então 80% ao mês. O Plano Collor, ou Plano Novo Brasil,
abrangia uma série de medidas para controlar a inflação e reestruturar o
Estado: reforma administrativa com demissão de funcionários públicos; abertura
comercial ao exterior e ao capital estrangeiro, eliminação dos incentivos
fiscais às indústrias; liberalização da taxa do dólar; e um programa de
privatizações das empresas estatais. O plano também recorria a métodos já
conhecidos dos brasileiros, como o congelamento de preços e salários e a adoção
de uma nova moeda. Saía o Cruzado Novo, voltava o Cruzeiro.
Havia
um item no plano que, contudo, que ninguém esperava: o confisco dos depósitos
bancários em contas-correntes, aplicações financeiras e cadernetas de poupança
por 18 meses. O objetivo era estabilizar a economia por meio da retirada de
dinheiro do mercado.
Um
ano depois, o governo Collor estava mergulhado na crise. Ao fracasso do Plano
Collor somavam-se denúncias de corrupção, abalando ainda mais o governo. O
ex-tesoureiro da campanha presidencial de Collor, Paulo César Farias, mais
conhecido como PC Farias arrecadava dinheiro de empresas, facilitava contratos
mediante elevadas comissões e, com elas, financiava as despesas pessoais do
presidente.
As
denúncias eram muito graves. Tanto que foi instituída no Congresso Nacional uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as acusações. Nas ruas
setores organizados da sociedade exigiam o impeachment do presidente.
Paulo César Farias e sua namorada foram encontrados mortos - crime ainda não solucionado. |
Milhares
de jovens estudantes com o rosto pintado de verde e amarelo, que ficaram
conhecidos como caras-pintadas, foram para as ruas protestar. Além do
impeachment do presidente, exigiam o fim da corrupção e a ética na política.
Em
29 de setembro de 1992, a Câmara dos Deputados aprovou o afastamento de Collor
da presidência: foram 441 votos a favor e 38 contra. Três meses depois, julgado
pelo Senado, Collor teve seu mandato e seus direitos políticos cassados por
oito anos. Vaga, a presidência da República foi assumida pelo vice, Itamar
Franco.
Movimento "caras-pintadas" |
Itamar
Franco assumiu a presidência com amplo apoio político no Congresso Nacional.
Fernando Henrique Cardoso foi nomeado ministro da Fazenda em março de 1993. Com
um grupo de economistas, ele começou a elaborar um plano para estabilizar a
economia do país.
Em
fevereiro do ano seguinte, o governo criou a Unidade Real de Valor (URV),
atrelando-a ao dólar. Se a arrecadação de impostos se mantivesse alta, os
gastos na área social fossem reduzidos e as grandes reservas em dólar,
preservadas, a URV se manteria estável.
Em
julho de 1994, o governo transformou a URV em uma nova moeda, o Real. Em apenas
15 dias, a inflação caiu drasticamente. O real equiparou-se ao dólar, obtendo
estabilidade. Era o fim da alta constante e acelerada dos preços, beneficiando
os assalariados.
Fernando Henrique Cardoso e o Plano Real. |
Com
o Plano Real, que conseguiu derrubar a inflação, Fernando Henrique Cardoso foi
lançado candidato à presidência pela coligação PSDB-PFL. Seu principal
adversário era Lula, novamente candidato pelo PT. Exausta da inflação, a
sociedade brasileira apoiou a estabilidade monetária e o Plano Real, elegendo
FHC já no primeiro turno com 54,27% dos votos.
Fernando
Henrique Cardoso foi eleito e assumiu a presidência com o projeto de reduzir o
tamanho do Estado e seu papel na economia. Adotando políticas neoliberais, o
presidente extinguiu o monopólio estatal da exploração e do refino do petróleo
pela Petrobrás, eliminou as restrições à entrada de capital estrangeiro no país
e implementou reformas administrativas. Era o fim da Era Vargas, segundo o
próprio FHC.
Além
disso, o governo estabeleceu acordos com o FMI e deu início a um programa de
privatização das estatais. Foram leiloadas empresas dos setores siderúrgico,
elétrico, químico, petroquímico e de fertilizantes. O mesmo ocorreu com portos,
rodovias e ferrovias. Bancos estaduais e empresas como a Embraer e a Companhia
Vale do Rio Doce também foram privatizados. Segundo dados do BNDS, entre 1991 e
2002, o governo federal arrecadou cerca de 30 bilhões de dólares com todas
essas vendas – 2 bilhões de dólares somente com a do Sistema Telebrás de
Telecomunicações.
Foi
também no governo FHC que a emenda à Constituição que dispunha sobre a
reeleição para cargos do Poder Executivo foi aprovada. Isso permitiu que o
presidente concorresse a um novo mandato nas eleições presidenciais de 1998.
Nas
eleições de 1998, Lula foi novamente o maior adversário de Fernando Henrique
Cardoso. Mesmo com a aliança de duas maiores lideranças de esquerda – o vice de
Lula era Leonel Brizola -, FHC foi reeleito com 53% dos votos.
Eleição de FHC - 1998. |
Em
seu segundo mandato, FHC deu continuidade ao Plano Real, preservando a
estabilidade da economia. A manutenção das taxas de juros altas e a
sobrevalorização do real aumentaram ainda mais a dívida pública nesses quatro
anos.
Em
2001, o presidente, que gozava de boa popularidade, teve sua imagem afetada
pelo chamado “apagão”. Uma seca inesperada esvaziou os reservatórios das hidrelétricas,
resultando em falta de energia no país. Sem planejamento e sem investimento no
setor, foi necessário impor um racionamento de energia à população.
Nas
eleições presidenciais de 2002, Lula foi novamente candidato pelo PT. Em sua
quarta disputa pela presidência, ele deixava de lado o discurso socialista dos
anos anteriores e apresentava um programa moderado, buscando o apoio das
classes médias e dos empresários.
Contando
com amplo apoio político, Lula recebeu 46,4% dos votos no primeiro turno das
eleições de 2002, e 61,2% no segundo turno.
Lula e José Alencar - 2002 |
Apesar
de alguns pontos semelhantes com o governo anterior, ao retomar o
nacional-desenvolvimentismo característico da Era Vargas, o novo governo
mostrou que ainda tinha um projeto político diferente de seu antecessor. Nesse
sentido, as privatizações foram suspensas e o papel do Estado, reforçado. A
pesquisa científica, por exemplo, recebeu apoio e incentivos financeiros.
Na
política externa, o governo Lula ampliou as relações comerciais e diplomáticas
do Brasil com os países da União Europeia, da África, da Ásia e da América
Latina. O reforço do Mercosul também foi uma iniciativa nesse sentido.
No
plano social, o governo dedicou-se ao combate da pobreza, retirando milhões de
pessoas da miséria. Além da criação do Programa Bolsa Família, em que há
transferência direta de renda às famílias em situação de pobreza, o governo
diminuiu os impostos sobre produtos da cesta básica e materiais de construção e
reajustou o salário mínimo acima dos índices de inflação, beneficiando os
trabalhadores e as camadas mais pobres da população.
Em
2005, no terceiro ano do mandato de Lula, vieram a público denúncias de que o
governo pagava regularmente a deputados e senadores para que matérias de
interesse do Executivo fossem aprovadas pelo Congresso. O “mensalão”, como o
esquema de corrupção ficou conhecido, envolvia empresários, ministros de Estado
e parlamentares. Em fins de 2012, muitos foram condenados em julgamento pelo
Supremo Tribunal Federal.
Mesmo
com a queda dos índices de popularidade do governo durante a crise política, o
presidente continuou a contar com o apoio de amplos setores da população.
Em
2006, Lula lançou-se à reeleição e foi eleito para um novo mandato, com a
maioria dos votos dos trabalhadores, dos setores mais pobres da população e de
parte significativa das classes médias. Ao ser novamente empossado presidente,
em 2007, Lula contava com uma ampla coalização de partidos políticos no
Congresso Nacional.
Lula (PT) e Geraldo Alckmim (PSDB) - Eleições de 2006. |
Apesar
dos juros altos praticados pelo Banco Central e do controle das contas públicas
pelo governo, necessários para garantir a estabilidade econômica do país, os
investimentos na área da educação triplicaram.
O
governo também investiu em energia e transporte; apoiou as indústrias de
exportação, obtendo saldos comerciais positivos; e incentivou a
internacionalização de muitas empresas. O bom desempenho da agricultura e o
aumento do preço de produtos primários no mercado internacional beneficiaram o
conjunto da economia.
No
plano social, o governo deu continuidade ao combate à pobreza. Além disso,
propiciou um aumento real do poder de compra dos trabalhadores, com a oferta de
crédito à população e outras medidas. O resultado foi a criação de 15 milhões
de novos empregos, a ascensão social de milhões de pessoas, o crescimento
acentuado da chamada classe C e o fortalecimento do mercado interno brasileiro.
Foi
devido ao fortalecimento de seu mercado interno que o Brasil demonstrou
capacidade de resistir à crise mundial que teve origem nos EUA em fins de 2007.
Em meados de 2009, o país voltou a crescer. Em 2010, o crescimento econômico
foi de 7%.
Ao
deixar o governo, em 1º de janeiro de 2011, Lula contava com 87% de aprovação
entre os brasileiros, segundo pesquisas de opinião encomendada pela
Confederação Nacional dos Transportes (CNT).
Para
concorrer à Presidência da República nas eleições de 2010, o partido dos
Trabalhadores (PT) lançou o nome de Dilma Rousseff, então ministra da Casa
Civil do governo Lula. A eleição foi decidida no segundo turno, com a vitória
de Dilma com 56,05% dos votos.
Dilma,
enquanto jovem, fora presa e torturada pela ditadura militar. Sua vitória
representou um grande avanço para a democracia brasileira. Pela primeira vez,
uma mulher e ex-integrante da luta armada contra a ditadura assumia o cargo de
presidente da República.
Dilma Rousseff - a primeira mulher eleita Presidente da República do Brasil. |
O
governo Dilma deu continuidade às políticas sociais e desenvolvimentistas do
governo Lula, como o programa Minha Casa, Minha Vida, e promoveu outros, como o
Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC);
No
final de 2011, os jornais noticiaram que o Brasil havia se tornado a 6ª maior
economia do mundo, ultrapassado a Grã-Bretanha, então na 7ª posição.
No
governo Dilma foi aprovado o Marcos Civil da Internet (2014), foram leiloados
campos de petróleo do pré-sal (2013) e foi instituída a Comissão Nacional da
Verdade (2012). Sua popularidade manteve-se em alta, mas foi abalada pelos
protestos que tomaram o país em junho de 2013. Ela sofreu críticas pelo baixo
crescimento do Produto Interno Bruto do país, pela alta da inflação e pelos
gastos com a Copa do Mundo de Futebol realizada no Brasil em 2014.
Ao
final de seu mandato, Dilma Rousseff concorreu à reeleição. Com 51,65% dos
votos, sua vitória sobre o candidato do PSDB foi apertada no segundo turno.
Dilma (PT) em debate contra Aécio Neves (PSDB) - Eleições de 2014 |
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