Durante as Regências, explodiram nas
províncias brasileiras, de norte a sul, rebeliões de grande impacto na história
social do país. Pobres e ricos, peões e fazendeiros, indígenas, mestiços,
negros e brancos chegaram a se unir contra o governo central, sediado no Rio de
Janeiro. Mas seus objetos não eram os mesmos: enquanto as elites das províncias
exigiam maior autonomia, os indígenas, negros e brancos pobres lutavam por
liberdade e uma vida melhor.
A Cabanagem
A
província do Grão-Pará, na época da Cabanagem, abrangia terras dos atuais
estados do Pará, Amapá, Roraima, Rondônia e Amazonas e tinha uma população estimada
em 120 mil habitantes.
ILUSTRAÇÃO DA GUERRA DE CABANAGEM |
A
economia do Grão-Pará baseava-se na exploração das drogas d sertão
(castanha-do-pará, cacau, baunilha), de madeiras e de ervas medicinais e na
pesca. Os trabalhadores da região eram, em sua maioria, muito pobres, viviam em
cabanas e trabalhavam para os fazendeiros ou para os comerciantes portugueses e
ingleses, que controlavam o comércio da região. Boa parte desses comerciantes
residia em Belém, condições de trabalho e o alto custo de vida.
Os
fazendeiros também estavam insatisfeitos por dois motivos: o presidente da
província, nomeado pelo governo central, era quase sempre favorável aos
portugueses e, além disso, não se importava com os problemas da população.
Reagindo
a essa situação, em 1835, homens ricos e influentes, aliados aos cabanos,
invadiram o Palácio do Governo, em Belém, e entregaram a chefia do primeiro
governo cabano ao fazendeiro Félix Melcher. Iniciava-se assim a Cabanagem.
Melcher, porém, traiu o movimento e prometeu fidelidade ao futuro imperador. Diante
disso, outro líder da revolta, Francisco Vinagre, venceu Melcher pelas armas e
assumiu o segundo governo cabano.
Vinagre,
no entanto, acabou fazendo o mesmo que Melcher e entregou governo da província
à autoridade enviada pelo governo regencial sediado no Rio de Janeiro. Mas os
cabanos continuaram resistindo no interior. Sob a liderança de Eduardo Angelim,
penetraram a região pelos rios, aliciaram ribeirinhos e, fortalecidos,
retomaram Belém.
PADRE FEIJÓ |
O
governo do padre Feijó, por sua vez, enviou ao Grão-Pará, em 1836, uma esquadra
comandada pelo brigadeiro Soares d’Andrea, que retomou a cidade de Belém. A repressão
à cabanagem foi brutal. Soares mandou prender e fuzilar cabanos sem julgamento
prévio.
Cerca
de 30 mil pessoas (40% da população da província) foram mortas. Os últimos
grupos se renderam somente em 1840. Os cabanos chegaram ao poder, mas não
conseguiram conservá-lo: as divergências entre seus líderes, a falta de um
programa de governo, a inferioridade bélica e uma epidemia de varíola que se
alastrou por Belém naquela época contribuíram para o fim da rebelião.
A Guerra dos Farrapos
O
mais duradouro movimento rebelde do Império foi a Guerra dos Farrapos, ocorrida
no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina entre 1835 e 1845. A população da
província de São Pedro do Rio Grande era de cerca de 150 mil pessoas, das quais
somente 10% viviam em Porto Alegre, sua capital.
No
interior, a base da economia era a criação de gado e a produção de charque
(carne salgada). Estancieiros e charqueadores lideravam aquela sociedade
militarizada que se formou durante os constantes conflitos com os castelhanos
nas terras ou nas fronteiras do Rio Grande do Sul. O charque, o gado, bem como
outros produtos gaúchos, como ouro, sebo e graxa, eram vendidos a outras
províncias brasileiras do Centro-Sul e do Nordeste. Ou seja, a produção gaúcha
destinava-se sobretudo ao mercado interno.
ILUSTRAÇÃO DA FARROUPILHA |
Ocorre
que o governo brasileiro cobrava altas taxas do charque rio-grandense e baixas
taxas do charque platino importado. Além disso, sobretaxava o sal que os rio-grandenses
importavam para fazer seu charque, levando-os a se sentirem duplamente
prejudicados. Os rio-grandenses reclamavam também que os presidentes de
província nomeados pelo governo eram quase sempre alheios aos seus interesses e
que o Rio Grande do Sul servia apenas como fornecedor de cavalos e homens às
tropas do governo nos constantes conflitos por terra e gado na região platina.
Em
20 de setembro de 1835, os farroupilhas, liderados pelo estancieiro Bento
Gonçalves, romperam com o presidente da província e invadiram Porto Alegre,
dando início à Guerra dos Farrapos.
Em
1836, após importantes vitórias sobre as tropas legalistas, os farroupilhas
proclamaram a República Rio-Grandense.
Em
outubro daquele ano, no entanto, vários chefes farroupilhas foram presos, entre
eles Bento Gonçalves, que foi levado para a Bahia. Mesmo preso, ele foi eleito
presidente dessa República, cuja capital era a cidade de Piratini. No ano
seguinte, com o auxílio da maçonaria, Bento Gonçalves fugiu da cadeia e reassumiu
o comando das forças farroupilhas, que, na época, já contavam com o apoio do
revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi. Os farroupilhas invadiram,
Canabarro fundaram a República Juliana. Pesquisas recentes indicam que a
população de Laguna, em Santa Catarina, colaborou com os rebeldes
fornecendo-lhes suporte e participando efetivamente da luta.
BARÃO DE CAXIAS |
Em
1842, o Império enviou ao Sul milhares de soldados sob o comando de Luís Alves
de Lima e Silva, o Barão de Caxias, para pressionar os chefes daquele movimento
que reunia, sob uma mesma bandeira, desde fazendeiros até peões e
ex-escravizados. Os farroupilhas não se renderam.
Então,
para pôr fim à guerra, Caxias, que representava o braço armado do Império,
propôs a chamada “paz honrosa”. Por meio deste acordo de paz assinado em 1845:
o
Os rio-grandenses
ganharam o direito de escolher seus presidentes de província;
o
Os comandantes
farroupilhas poderiam passar ao Exército brasileiro com os mesmos postos que
ocupavam nas tropas rebeldes;
o
O charque
platino pagaria 25% a mais de impostos para entrar no mercado brasileiro;
o
O governo
imperial reconheceria a liberdade dos escravos que lutaram nas frças
farroupilhas como soldados.
A Revolta dos Malês
Salvador,
em 1835, possuía cerca de 65 mil habitantes. Essas pessoas tinham entre si
diferenças profundas na maneira de trabalhar, tirar folga e orar. A origem, a
condição social e a cor da pele eram outras diferenças importantes para
compreendermos por que, na Bahia do século XIX, uma maioria de negros e
mestiços era oprimida por uma minoria de brancos.
Escravizados
ou libertos, os africanos eram as maiores vítimas dessa opressão. Muitos resistiam
a isso organizando comunidades de terreiros para cultuar os orixás, os voduns
ou os espíritos ancestrais. Outros aderiram ao catolicismos e o praticavam à
sua maneira. Outros ainda optaram pelo chamado culto malê, que vinha se
tornando popular na capital baiana.
O
culto malê era uma combinação de elementos das religiões africanas e dos
princípios muçulmanos contidos no Corão (o livro sagrado dos muçulmanos). Os malês
não comiam carne de porco, jejuavam às sextas-feiras e, uma vez por ano, faziam
uma dieta especial à base de inhame, língua de vaca, arroz, leite e mel. O tempo
de duração desse sacrifício é conhecido como Ramadã (mês do jejum muçulmano).
Os
negros, escravizados ou livres, eram explorados no trabalho, desprezados por sua
cor e perseguidos por causa de suas religiões. Todos entraram no Brasil como
cativos e tinham motivos de sobra para deixar de lado diferenças de origem e
religião e lutar contra seus opressores.
A
data escolhida foi 25 de janeiro de 1835, um domingo, dia de homenagem a Nossa
Senhora da Guia. A luta pela Bahia durou a noite inteira. Agitando espadas,
facas e lanças, os negros enfrentaram soldados armados com garruchas, que
fugiam do corpo a corpo, atirando neles dentro do quartel.
Cerca
de 50 africanos morreram durante os combates e muitos outros ficaram feridos,
vindo a falecer posteriormente. O tribunal que julgou os rebeldes procurou
provar a superioridade dos brancos sobre os negros, dos homens de posses sobre
os escravos, da religião católica sobre as outras. Qualquer objeto da África
encontrado pela polícia baiana era considerado criminosos. Além dos abadás,
rosários e escritos religiosos dos malês, as autoridades apreenderam atabaques,
colares de búzios, panos de costa, entre outros.
Sufocada
a rebelião, os vencedores se lançaram à vingança. Em março de 1835, centenas de
africanos libertos foram mandados de volta para a África. A maioria voltou para
os lugares de onde veio; Lagos, Nigéria e Daomé. Essas pessoas tinham
trabalhado muitos anos para conseguir comprar a carta de alforria. Agora, mesmo
os considerados inocentes, eram ilegalmente expulsos da Bahia. O objetivo das
autoridade, segundo o historiador João José Reis, era o branqueamento da
sociedade livre baiana.
A Sabina
Na
Bahia, era grande a insatisfação com a política centralizadora do governo
instalado no Rio de Janeiro. Os principais motivos dessa insatisfação eram: o
envio obrigatório de rendas para o Rio de Janeiro; a necessidade de fornecer
soldados para lutar no sul; e a prolongada crise de abastecimento que provocava
carestia e fome.
FERNANDO SABINO VIEIRA |
Em
salvador, o jornal Novo Diário da Bahia, do médico e jornalista republicano
Fernando Sabino Vieira, o dr. Sabio, intelectual e conhecedor das ideias
iluministas, era o principal porta-voz da oposição ao governo. Em 7 de setembro
de 1837, reagindo á notícia de que os baianos seriam convocados para lutar
contra os farroupilhas, militares rebeldes tomaram o Forte de São Pedro, em
Salvador, obrigando o presidente da província a fugir da cidade. Tinha início a
Sabinada, revolta cujo nome se deve ao seu principal líder, Francisco Sabino.
Os
sabinos proclamaram a independência, mas logo declararam que ela duraria
somente até a maioridade de Dom Pedro II. A reação partiu do Recôncavo, onde os
proprietários locais organizaram um governo paralelo na cidade de Cachoeira,
controlado pelas forças legalistas, e outro em Salvador, comandado pelos
sabinos.
O
governo central então decidiu agir: enviou forças que se juntaram ás do
Recôncavo e cercaram Salvador por terra, enquanto a Marinha Imperial bloqueava
a cidade por mar. Diante do cerco a Salvador e da falta de alimentos, os
rebeldes convocaram os escravizados para lutar ao lado deles. Muitos, porém,
não atenderam a esse apelo, pois não viam a Sabinada como uma luta deles. De sua
parte, muitos proprietários, assustados com a possibilidade de perder seus
escravos, passaram a defender o governo central.
Com
cerca de 4 mil homens, as forças legalistas invadiram a capital baiana e
promoveram um verdadeiro massacre. O tribunal que julgou os sabinos ficou
conhecido como “júri de sangue”, pois os condenou em massa. Francisco Sabino
Vieira foi expulso da Bahia com os outros líderes que sobreviveram ao massacre.
A Balaiada
Ocorrida
nas terras do atual Estado do Maranhão e do Piauí, entre 1838 e 1841, a
Balaiada teve suas raízes na luta da população pobre contra a opressão, na luta
dos políticos provinciais por autonomia em relação ao Império, nos conflitos
por hegemonia na respectiva província e também nas dificuldades econômicas
enfrentadas pelo Nordeste no período regencial.
Quando
regente Araújo Lima foi eleito, os conservadores assumiram os principais postos
no Maranhão, inclusive o de presidente da província, passando a usar o
recrutamento forçado para enfraquecer os liberais, apelidados na região de
bem-te-vis.
Nesse
contexto, um grupo armado chefiado pelo vaqueiro Raimundo Gomes assaltou a
cadeia da Vila do Manga e libertou vários companheiros que estavam presos. A seguir,
o grupo lançou um manifesto em que se declarava inimigo dos portugueses e
exigia a demissão do presidente da província.
Enquanto
o grupo de Raimundo Gomes percorria o interior apoderando-se de várias
localidades, o movimento ganhava novos líderes, a exemplo do artesão mestiço Manoel
Francisco dos Anjos Ferreira, o Balaio, e o negro Cosme Bento das Chagas, que
liderava 3 mil quilombolas fugidos das fazendas maranhenses. Fortalecidos, em
meados de 1839, os balaios conquistaram Caxias, a segunda maior cidade do Maranhão,
e avançaram em direção a Piauí, onde, com a ajuda da população local, venceram
tropas oficiais enviadas para combatê-los.
Inicialmente,
os políticos liberais incentivaram os balaios, ao mesmo tempo que culpavam os conservadores
pela “desordem”; esperavam, com isso, desalojá-los do poder nas próximas
eleições. Mas, quando viram que a capital maranhense seria invadida pelos
balaios, os liberais se juntaram aos conservadores para pedir reforços ao
governo central.
LUÍS ALVES DE LIMA E SILVA |
Este
enviou para o Maranhão cerca de 8 mil homens sob o comando de Luís Alves de
Lima e Silva. A repressão ao movimento efetuou torturas, prisões e milhares de
execuções sem direito à defesa. Calcula-se que cerca de 11 mil balaios tenham
morrido em combate com as tropas imperiais. Quanto aos líderes, Manoel Francisco
dos Anjos morreu lutando, Raimundo Gomes foi expulso do Maranhão e Cosme Bento
das Chagas acabou preso e enforcado em praça pública para servir de exemplo aos
que ousassem desafiar as elites imperiais.
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Moisés Rodrigues
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