quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Abertura “lenta, gradual e segura” – a volta à democracia.

         Com o endurecimento político, alguns grupos opositores decidiram partir para a luta armada. Promoveram diversas ações violentas, incluindo assaltos a bancos, com o objetivo de obter dinheiro para financiar a luta, e sequestros de diplomatas estrangeiros, para trocá-los por presos políticos.
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Carlos Lamarca - líder da VPR.
Dois líderes guerrilheiros desse período, o ex-deputado comunista Carlos Marighella (da Ação Libertadora Nacional – ANL) e o ex-capitão do Exército Carlos Lamarca (da Vanguarda Popular Revolucionária – VPR), foram mortos. Além deles, milhares de pessoas acusadas de subversão foram torturadas pelos agentes da repressão; centenas delas foram mortas em todo o país.
O governo médici foi marcado ainda por um período de desenvolvimento econômico que a propaganda oficial chamou de “milagre brasileiro”, destacado por grandes projetos de integração nacional – como a rodovia transamazônica – e de crescimento econômico.

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Carlos Marighella, vítima de uma emboscada planejada pelos militares.
Comandada por Antônio Delfim Neto, ministro da Fazenda desde o governo Costa e Silva, a economia passou a crescer a altas taxas anuais, tendo como base o aumento da produção industrial – com destaque para a indústria automobilística -, o crescimento da geração de energia elétrica e das exportações (bens manufaturados, veículos etc) e a acentuada utilização de capital estrangeiro na forma de investimentos diretos e empréstimos.
A contrapartida desse crescimento foi a adoção de uma rígida política de arrocho salarial, contra a qual os trabalhadores e os sindicatos não podiam reagir devido à repressão política. A concentração de renda no país se intensificou. O próprio presidente Médici teia admitido o lado desfavorável do “milagre brasileiro” ao afirmar: a economia vai bem, mas o povo vai mal”.
Segundo Elio Gaspari, “o Milagre Brasileiro e os Anos de Chumbo foram simultâneos. Ambos reais, coexistiram negando-se (...). Quem acha que houve um, não acredita (ou não gosta de admitir) que houve o outro”.
O “milagre”, porém, durou pouco. A partir de 1973, teve início a primeira crise do petróleo, que provocou uma alta vertiginosa nos preços desse produto. A economia mundial desestabilizou-se, e a brasileira – que não se baseava de forma predominante nas próprias forças econômicas – sofreu grande impacto. A inflação começou a subir, e a dívida externa elevou-se de maneira assustadora.
Teve início, então, uma longa e amarga crise econômica. O governo militar começou a perder um de seus principais argumentos de sustentação no poder: estava provado que a ditadura não garantia o desenvolvimento.
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Ernesto Geisel
Terminado o mandato de Médici, o general Ernesto Geisel foi indicado pelo alto comando militar para sucedê-lo. Pela primeira vez, no entanto, havia um concorrente indicado pelo partido da oposição: foi a chamada anticandidatura do deputado Ulysses Guimarães, do MDB, cujo objetivo era denunciar a farsa do processo eleitoral. Geisel foi eleito pelo Colégio Eleitoral, com os votos dos membros da ARENA, e assumiu o cargo em 15 de março de 1974.
Geisel integrava um grupo de oficiais militares favoráveis à devolução gradual do poder aos civis e dizia-se disposto a promover um processo “gradual, lento e seguro” de abertura democrática. Com “seguro” o novo presidente queria dizer que não permitiria uma guinada “à esquerda” no regime político e garantiria a manutenção das grandes diretrizes do golpe de 1964.
No plano econômico, Geisel recebeu um país com dificuldades que anunciavam o fim do “milagre”: queda do PIB, aumento da inflação e uma enorme dívida externa. Com a crise do petróleo, o novo governo percebeu que era necessário modificar alguns fundamentos da política econômica adotada até então, tanto no plano interno como no externo.
O governo Geisel iniciou o processo de abertura política do regime militar diminuindo a censura sobre os meios de comunicação e realizando, em 1974, eleições livres para senador, deputado e vereador.
Nessas eleições, o MDB, único partido de oposição, alcançou uma vitória significativa sobre a Arena, o partido do governo. Isso assustou os militares da chamada linha dura. Apesar das declarações do governo, os comandantes dos órgãos de repressão não tinham nenhuma simpatia pela ideia de uma abertura democrática, razão pela qual continuaram agindo com a mesma violência do período anterior.
Foi nesse contexto que ocorreu, em São Paulo, a morte do jornalista Vladimir Herzog, em outubro de 1975. O fato foi noticiado na grande imprensa. Pouco tempo depois, em janeiro de 1976, morreu o operário Manoel Fiel Filho. Ambos haviam sido presos, torturados e mortos nas dependências do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), ligado ao II Exército.

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Jornalista Vladimir Herzog, encontrado morto nas dependências do DOI-CODI.

     As ações dos órgãos de repressão, que alegavam agir em nome da segurança nacional, escandalizaram a opinião pública. Geisel reagiu afastando imediatamente o general comandante do II Exército. Em outubro de 1977, exonerou o ministro da Guerra, general Silvio Frota, que pertencia à chamada linha dura.
Em face da derrota do governo nas eleições nas eleições de 1974, Geisel decidiu recuar no processo de abertura política. Sua preocupação eram as eleições municipais de 1976 e, depois, as eleições estaduais e federais de 1978. Os problemas econômicos do país, junto com as críticas da oposição, poderiam determinar uma votação contrária ao governo. Assim, foram decretadas novas normas restritivas em relação ao processo político-eleitoral, como a Lei Falcão e o Pacote de Abril.
Decretada em junho de 1976, a Lei Falcão – cujo nome deriva do ministro da Justiça, Armando Falcão – limitava a propaganda eleitoral, no rádio e na televisão, à apresentação protocolar de um breve resumo das atividades políticas do candidato. Foi a forma encontrada pelo governo para impedir o debate político.
Com o Pacote de Abril, divulgado em abril de 1977, Geisel fechou o Congresso Nacional por duas semanas e decretou uma série de normas autoritárias que, entre outras medidas, determinava que um terço dos senadores fosse escolhido por eleições indiretas. Criava-se o que a imprensa apelidou, pejorativamente, de senadores biônicos, isto é, que não eram eleitos pelo voto popular e sempre votavam a favor do governo.
Durante o processo de abertura política, destacou-se o surgimento de um novo sindicalismo, de perfil oposicionista em relação às diretrizes governamentais. Esse movimento liderou as primeiras greves operárias contra o achatamento dos salários e o autoritarismo do governo militar.
Durante o ano de 1979, em todo o país, mais de 3 milhões de trabalhadores fizeram greve. Entre as paralisações destacaram-se as greves dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, sob a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC – região que abrange os municípios paulistas de Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul e concentrava grandes e médias industriais metalúrgicas na época.

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Luiz Inácio Lula da Silva - presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

O primeiro grande marco do processo de redemocratização foi a Lei da Anistia, que resultou de um movimento nacional impulsionado por vários segmentos da sociedade civil.
Milhares de pessoas foram beneficiadas com a anistia promulgada em agosto de 1979: os presos políticos da ditadura militar puderam ser liberados; os brasileiros que estavam exilados em outros países tiveram a possibilidade de regressar ao Brasil; as pessoas que tinham perdido seus direitos políticos foram reabilitadas em sua cidadania.
Em contrapartida, a anistia foi ampla o suficiente para absolver os militares acusados de praticar torturas ou cometer assassinatos. Mas não foi irrestrita. Militares punidos por não terem se engajado no golpe e aqueles que haviam cometido atos considerados terroristas pelo regime militar não foram beneficiados com a anistia.
Outra mudança foi a aprovação pelo Congresso, em novembro de 1979, de uma Lei Orgânica dos Partidos, que restabeleceu o pluripartidarismo, acabando, portanto, com o bipartidarismo no país. Os registros da Arena e MDB foram cancelados e nos meses seguintes formaram-se seis novas legendas que deveriam contar, obrigatoriamente, com a palavra partido em seu nome. Entre elas: o Partido Democrático Social (PSD), o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB); Partido dos Trabalhadores (PT); o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB); o Partido Democrático Trabalhista (PDT); o Partido Popular (PP); dentre outros.
Foi no agravamento da crise econômica e da insatisfação popular com o governo que ocorreram as eleições de 1982. Apesar da continuidade da Lei Falcão e de outras dificuldades impostas pelo governo, o eleitorado manifestou seu descontentamento elegendo um grande número de candidatos da oposição nos estados mais populosos, onde os movimentos sociais eram mais organizados.
Em 15 de março de 1983, depois de 18 anos de ditadura, novos governadores, eleitos pelo voto direto, assumiram a liderança dos estados brasileiros. Com força renovada, as oposições políticas passaram a exigir eleições diretas para presidente da República e a volta dos civis ao poder.
De janeiro a abril de 1984, a campanha pelas eleições diretas reuniu milhões de pessoas em diversas cidades do país. Esse movimento ficou conhecido pelo nome Diretas já.

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Movimento conhecido como Diretas já

O presidente Figueiredo mostrava-se irresoluto sobre a sucessão presidencial, ora dizendo que não tinha apego pelo poder, ora dando sinais de querer permanecer. Mas parecia certo que ele pretendia que a próxima eleição presidencial fosse pela via indireta. Na véspera da votação da emenda Dante de Oliveira, marcada para 25 de abril de 1984, o governo decretou estado de emergência em Brasília, e forças policiais militares cercaram o Congresso. Os governistas alegavam que havia necessidade de proteger os parlamentares da “pressão popular”.
No dia da votação, apesar da ampla mobilização da sociedade civil, a emenda Dante de Oliveira não alcançou número suficiente de votos na Câmara para entrar em vigor. Uma série de manobras de políticos ligados ao regime militar impediu que se obtivesse o número de votos necessários.
O principal grupo contrário à emenda Dante de Oliveira era liderado pelo então deputado federal paulista Paulo Maluf, que acreditava poder eleger-se para a presidência da República por meio das eleições indiretas promovidas no Colégio Eleitoral.
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Eleição direta para presidente da República, 1985. Tancredo Neves (ligado aos movimentos de oposição à ditadura militar) e Paulo Maluf (político defensor dos princípios institucionais da ARENA, partido ligado aos militares)
Em 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral deu maioria de votos à chapa da Aliança Democrática, elegendo Tancredo Neves como sucessor de Figueiredo. Apesar da eleição indireta, a escolha de Tancredo foi bem acolhida pela população, despertando um sentimento de esperança de transformações democráticas.
Tancredo era conhecido como um político conciliador. Na qualidade de presidente eleito, visitou governantes de diversos países no mês seguinte e, quando voltou, negociou e anunciou seu ministério. No entanto, atingido por grave enfermidade, foi internado na véspera da posse (14 de março) e não pôde assumir a presidência.

Submetido a várias cirurgias, faleceu no dia 21 de abril de 1985, deixando de luto boa parte da sociedade. Por força de uma lei de 21 de abril de 1986, Tancredo Neves é considerado ex-presidente do Brasil, embora não tenha sido empossado.  

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Cortejo fúnebre de Tancredo Neves.

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