Martinho Lutero |
A Reforma Protestante e a Reforma
Católica integram um conjunto de acontecimentos que marcaram a transição do
feudalismo para uma sociedade aos moldes burgueses na Europa ocidental. Além
disso, foi um movimento portador de críticas aos dogmas e práticas do
catolicismo, que abalaram a autoridade da hierarquia eclesiástica. Com o apoio
de segmentos sociais interessados na diminuição do poder do papa, ela
contribuiu para modificar as instituições políticas, sociais e econômicas
europeias. O termo protestantismo não designa uma Igreja ou seita específica,
mas o movimento de reforma religiosa iniciado na Alemanha por Martinho Lutero,
que deu origem a diversos agrupamentos evangélicos.
A
Reforma Protestante tornou-se mais intensa com as pregações de Martinho Lutero,
monge agostiniano e doutor em Teologia pela Universidade de Wittenberg, na
Alemanha. Ele acreditava nas ideias de Jan Huss principalmente no que dizia
respeito às propostas de liberdade de culto e de liberdade de consciência individual.
Divergindo das orientações de Roma, Lutero acreditava que a salvação da alma
resultava da fé, a graça divina mais importante do homem; e que as boas em nada
influíam para a salvação. A partir dessas ideias, Lutero condenou a compra de
indulgências como passaporte ao reino dos céus.
As condições políticas e econômicas
do Santo Império Romano-Germânico favoreceram a difusão das concepções de
Lutero. O Império era formado por diversos principados independentes governados
por nobres que elegiam o imperador. Além disso, muitos feudos eram controlados
pelo clero, que conseguiam lucros com o arrendamento dessas terras. Outras
fontes de renda da Igreja provinham da arrecadação do dízimo e do comércio de
indulgências. Diante do poderio econômico e dos abusos cometidos pelos
eclesiásticos, diversos segmentos sociais faziam fortes críticas à Igreja,
criando um terreno favorável para a proposta de reforma religiosa.
Mas os diferentes grupos sociais dos
principados alemães tinham características, objetivos e interesses diferentes.
A burguesia queria um clero menos intransigente e ao mesmo tempo desejava
reduzir a transferência de capitais para Roma; a nobreza desejava apoderar-se
das terras eclesiásticas, enquanto os camponeses viam na Igreja Católica um dos
maiores exploradores do Império devido à cobrança dos dízimos. Eles queriam
terras para cultivar. E também estavam dispostos a lutar para se livrar da
dominação dos grandes nobres, qualquer que fosse a sua religião.
Martinho Lutero e as 95 teses |
No ano de 1517, denunciando a venda de
indulgências e a doutrina da salvação pelas obras, Lutero afixou na porta da
Igreja de Wittenberg, onde era sacerdote, um documento que apontava noventa e
cinco críticas ao papado, conhecido como as 95
teses de Lutero. O aparecimento de tais teses deu início ao confronto entre
Roma e o monge rebelde. Leão X exigiu que Lutero se retratasse, sob pena de ser
considerado herético. Lutero respondeu à ordem papal queimando publicamente o
documento que continha a intimação vinda de Roma. Como consequência, foi excomungado
mas, com a proteção da nobreza alemã, conseguiu manter-se escondido por algum
tempo.
Em apoio às decisões do papa, o
imperador Carlos V convocou Lutero a comparecer diante da Dieta de Worms,
assembleia imperial, para que fosse julgado pelos príncipes alemães. O
julgamento foi favorável a Lutero, uma vez que a maioria dos nobres era hostil
a Roma. Contrariando a decisão da Assembleia, Carlos V determinou o banimento
de Lutero dos territórios imperiais. Mas Frederico da Saxônia o acolheu nos
seus domínios, situados entre os rios Reno e o mar Báltico. Outros príncipes
financiaram a divulgação das ideias luteranas por todo o país.
A Reforma religiosa na Suíça
representou, antes de tudo, uma necessidade burguesa. Tal classe social
necessitava, desse modo, de novos parâmetros morais, econômicos e religiosos
que legitimassem a obtenção do lucro por meio do comércio e da exploração do
trabalho assalariado.
Ulrico Zwinglio, ardente defensor
das ideias de Lutero, foi o iniciador da reforma religiosa na Suíça. De
formação humanista, ordenou-se padre em 1517, mostrando-se sempre muito crítico
em relação aos dogmas da Igreja Católica. Sua atuação humanitária no auxílio
aos pobres e doentes nas ruas de Zurique, durante a peste bubônica que assolou
a Suíça em 1519, tornou-se muito popular. Essa passagem de sua vida levou-o a
refletir sobre a necessidade de viver mais intensamente a religião. Em seus
sermões, passou a discutir a urgência de reformar o cristianismo.
Zwinglio defendia a predestinação e
condenava a confissão, alegando que cabia a Deus e não aos padres perdoar os
pecados. Por iniciativa sua, a religião reformada estendeu-se pelo norte da
Suíça. Em 1531, quando tentava levar seus ensinamentos a grupos mais
conservadores, teve início uma guerra civil que provocou a morte do reformador.
Mas suas propostas saíram vitoriosas, consagradas no acordo conhecido como a
Paz de Kappel, pelo qual o governo de cada região suíça teria direito de
escolher sua própria religião.
João Calvino |
A cidade-república de Genebra foi o
cenário e o laboratório para a atuação de um dos maiores impulsionadores da
Reforma, o teólogo João Calvino. Ao converter-se ao luteranismo por volta de
1530, Calvino renunciou a alguns benefícios eclesiásticos. Em razão disso, foi
perseguido e transferiu-se para Genebra em 1536. João Calvino reafirmava as
doutrinas luteranas da salvação pela fé e levava às últimas consequências a
teoria da predestinação.
Os princípios calvinistas pregavam o
rigor da disciplina, a valorização moral do trabalho e da poupança, oferecendo
aos setores burgueses uma justificativa religiosa sólida e bem elaborada para
suas atividades. Esse aspecto de justificativa ideológica contribuiu para que a
doutrina calvinista ganhasse adeptos nas principais cidades-repúblicas da
Suíça. A partir de 1541, tanto o governo como a religião de Genebra estavam nas
mãos de Calvino, que exerceu o poder por intermédio de uma oligarquia religiosa
conservadora sob o controle de um consórcio (assembleia). Detendo uma
autoridade ilimitada, esse órgão controlava o cotidiano das pessoas,
obrigando-as a participar de cultos e da comunhão.
As ideias de Calvino expandiram-se
pela Europa ocidental, região na qual o desenvolvimento das práticas
capitalistas abria um campo favorável para uma reforma religiosa que justificasse
e além disso impulsionasse as atividades dos setores mercantis e
manufatureiros. Em cada país, grupos religiosos de inspiração calvinista,
organizados pela burguesia local, empenharam-se na conversão de outras camadas
sociais. Na Inglaterra (puritanos), na Escócia (presbiterianos), na França
(huguenotes) e em muitas outras regiões surgiram adeptos da fé e da ética
conservadora calvinista.
Já na Inglaterra, a Reforma aconteceu
antes mesmo de Lutero ter consolidado sua influência doutrinária nos territórios
alemães. Como acontecia em outros países, na Inglaterra a Igreja Católica
detinha a posse de grandes extensões de terras, cobiçadas pela coroa e pela
nobreza. As ideias dos humanistas e dos pensadores do Renascimento corroíam a
autoridade tradicional e, para agravar a situação, as influências da Reforma
chegavam ao país. A penetração das ideias de Lutero e mais tarde de Calvino nas
camadas sociais teve repercussões importantes para a história do protestantismo
na Inglaterra.
Henrique VIII, o fundador da Igreja Anglicana na Inglaterra |
O início da reforma religiosa inglesa se deu por iniciativa do rei Henrique VIII, que encontrou apoio em seus súditos para a organização da Igreja Anglicana. Mas isso não significou que a ruptura com a Igreja Católica no país tenha sido apenas uma questão política. O conflito entre o rei e o papa foi desencadeado por problemas domésticos. Em 1527, Henrique VIII solicitou ao papa autorização para anular o seu casamento com a espanhola Catarina de Aragão. Tal pedido justificava-se no fato de ele e Catarina terem apenas uma filha, com saúde comprometida, e portanto inapta para subir ao trono da Inglaterra no momento necessário.
Envolvido com uma dama inglesa, Ana
Bolena, o rei pretendia resolver o problema da sucessão casando-se novamente, e
para isso aguardava a autorização da Santa Sé. Mas o papa Clemente VII evitava
intervir nessa questão, uma vez que Catarina era sobrinha do Imperador Carlos
V, do Sacro Império Germânico, que no momento auxiliava a Igreja no combate aos
luteranos. Os infindáveis adiamentos do papa levaram Henrique VIII a tomar a
iniciativa em 1531, obrigando o Parlamento a votar uma série de leis que
colocou a Igreja Católica inglesa sob o controle do Estado. O rei se tornou
chefe supremo da Igreja Anglicana através do Ato de Supremacia, podendo nomear
os eclesiásticos e determinar os dogmas religiosos. A resposta do papa foi a
excomunhão de Henrique VIII.
A complementação da obra reformista de
Henrique VIII foi realizada no reinado de Elizabeth I, sua filha com Ana
Bolena. Entremeando características do anglicanismo e do calvinismo, a nova
Igreja Anglicana procurou chegar a uma conciliação das regras religiosas na
Inglaterra, na tentativa de impedir a divisão do reino por questões de crença.
No que se refere às origens da Reforma
Católica ou contrarreforma podem ser buscadas a partir dos últimos anos do
século XV, antes mesmo, portanto, da Reforma Protestante. A reação de Roma
frente à expansão do protestantismo veio através de várias medidas, entre elas
a reorganização do Tribunal do Santo Ofício, que atuava na Europa desde a Idade
Média, julgando e punindo aqueles que
fossem suspeitos de difundir ideias e práticas religiosas em desacordo com a
Igreja Católica.
O Concílio de Trento |
Além disso, por iniciativa do papa
Paulo III, a Igreja Católica realizou um dos encontros mais importante de sua
história milenar: o Concílio de Trento. O Concílio realizou-se de 1545 a 1563,
com algumas interrupções, e teve como objetivo principal posicionar-se frente
às críticas protestantes. Dentre as decisões mais importantes tomadas em
Trento, destacaram-se a reafirmação dos dogmas católicos, a manutenção dos
sacramentos, a confirmação da transubstanciação, da hierarquia do clero e o
celibato clerical.
O Concílio também formulou normas para
coibir abusos como a venda de indulgências e aprovou propostas para a fundação de
seminários de teologia, destinados a melhorar a formação do clero. Por último,
surgiu o Index, uma lista de livros cuja leitura era proibida aos católicos.
O movimento católico foi ainda reforçada
pela estruturação de ordens religiosas, sendo uma das mais importantes a
Companhia de Jesus, fundada por Inácio Loyola. Os Jesuítas, como ficaram
conhecidos seus integrantes, se organizaram como um verdadeiro exército para a
contraofensiva católica. Responsáveis pelo fortalecimento do catolicismo em
muitos dos países em que atuaram, transformaram-se em educadores e
desempenharam, por exemplo, um papel fundamental na catequese dos povos nativos
das colônias portuguesas e espanholas na América.
Padres Jesuítas |
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