Os segmentos conservadores que
haviam conspirado contra o governo de João Goulart, que organizaram movimentos
como a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, acreditavam que a
intervenção militar rápida e austera daria ao Brasil o crescimento econômico. Além
disso, defendiam a ideia de que somente um regime militar controlaria a
inflação, acabaria com os casos de corrupção e do “perigo vermelho”. Em vez
disso, o golpe de Estado de 31 de março de 1964, que afastou o presidente,
marcou o início de mais de vinte anos de arbítrio na vida brasileira.
Humberto de Alencar Castelo Branco |
O Congresso Nacional conduziu à presidência
da República o general Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-1967). Sua
escolha por via indireta, quebrando a linha da sucessão constitucional, foi
legitimada pelo Ato Adicional Nº 1, decretado quatro dias antes, em 7 de abril
de 1964. Além de determinar a eleição presidencial pelo Congresso, o AI-1
estabeleceu que: o presidente da República poderia remeter ao Congresso
sugestões para a reforma da Constituição de 1946 e leis sobre qualquer assunto,
inclusive para criar ou aumentar despesas públicas; as investigações e
processos legais com relação a crimes contra o Estado ou sua propriedade, bem
como ordem política e social, poderiam ser instaurados contra indivíduos ou
coletivamente; os comandantes-em-chefe das Forças Armadas poderiam suspender
direitos políticos por um prazo de 10 anos e anular mandatos legislativos.
Em 1965, a perspectiva de uma
vitória da oposição nas eleições estaduais de 1966, em Minas Gerais e no Estado
da Guanabara, levou os militares a pôr fim aos partidos políticos através do
Ato Institucional Nº 2. Todos os partidos políticos foram extintos e em seus lugares
surgiram apenas duas frentes: a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), que
apoiava o regime; e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro) de oposição, porém
restrita.
Em seguida, a Constituição de 1946
foi reformada através do Ato Institucional Nº 3 de 5 de fevereiro de 1966, que
estabeleceu o sistema de eleições indiretas e se propôs a institucionalizar o
regime militar. A fim de aprovar um novo texto constitucional, o Congresso foi
provocado para uma sucessão extraordinária após a instituição do AI-4.
A carta de 1967 aumentou ainda mais
o poder Executivo, limitou a autonomia dos Estados, enfraquecendo o princípio
federalista, e centralizou a estrutura do processo de tomada de decisões. Foram
também promulgadas uma severa lei de imprensa e a Lei de Segurança Nacional,
destinada a criar todas as facilidades para que os órgãos de segurança do
Estado pudessem atuar contra denominados “inimigos internos”. Logo viriam novos
golpes contra as liberdades civis.
Presidente-general Costa e Silva |
Durante o governo do general Costa e
Silva, a resistência civil ganhou as ruas das principais cidades, os palcos e
as escolas. A resposta do governo do governo veio através da edição do Ato
Institucional Nº 5, que tornou o regime ainda mais repressor. O AI-5 fechou o
Congresso Nacional, cassou mandatos parlamentares, estabeleceu a censura prévia
e inquéritos militares sigilosos, além de mobilizar todas as forças repressoras
para fazer a um “processo de guerra revolucionária”.
Para aumentar a eficiência dos
mecanismos de repressão e controle da “ordem” foram criadas organizações como
Operação Bandeirantes (OBAN), composta por membros das Forças Armadas, Polícia
Política Estadual (DOPS e mais tarde DEOPS: Departamento de Ordem Pública e
Social). A OBAN inspirou a implantação, em escala nacional, de organismos
oficiais que receberam a sigla DOI-CODI (Destacamento de Operações de
Informações – Centro de Operações de Defesa Interna). O intrincado aparelho
repressivo foi responsável pelo desaparecimento, morte e tortura de centenas de
brasileiros, alguns praticamente sem envolvimento político. O relato que se
segue é de sobreviventes dos episódios de tortura da Ditadura Militar:
A
assistente social Ilda Brandle Siegl, de 26 anos, declaru em seu depoimento no
Rio de janeiro, em 1970: “(...) que disseram a ela que a tortura ali era
científica, não deixava marca; que foi espancada e despiram a depoente e
provocaram choques elétricos; que, enquanto um aplicava choque, o Dr. Mimoso abanava
a depoente para que a mesma não desmaiasse; que havia pausa a critério médico;
que aplicaram choques nos seios, no umbigo e na parte interna das coxas; que,
após, foi afogada numa cadeira, que já não podia ficar de pé (....)”
Prática de tortura conhecida como pau-de-arara |
A
estudante Iná de Souza Medeiros, de 21 anos, contou ao Conselho de Justiça: “(...)
que, após, trouxeram Milton despido, pendurando no pau-de-arara, para que a
declarante visse o seu estado e dizendo que, com ela, fariam a mesma coisa e,
constantemente, os torturadores proferiam nomes contra Milton e a declarante;
(...) que essas moças levaram ferra na unha, choques elétricos e tentativa de
afogamento que consistia em tapar o nariz da pessoa e jogar água em cima(...)
Vladimir Herzog, encontrado morto nas dependências do DOI-CODI |
General-presidente Médice e o capitão da seleção Carlos Alberto Torres |
O governo do presidente Emílio
Garrastazu Médici foi marcado pelo silêncio das oposições, graças à dura
repressão desencadeada pelos órgãos de segurança. Em contrapartida, a
propaganda oficial realizada pela Assessoria Especial de Relações Públicas
(AERP) se utilizou de jornais, cinema e sobretudo da televisão para divulgar slogans:
“Ninguém segura esse país” e “Brasil, ame-o ou deixe-o”. A publicidade
governamental atingiu seu clímax quando o Brasil ganhou a copa do mundo,
disputada no México em 1970. A conquista do tricampeonato de futebol deixou o
país em delírio, levando o presidente a conceder prêmios aos jogadores e a se
deixar fotografar ao lado da taça Jules Rimet.
O quarto general-presidente, Ernesto
Geisel foi escolhido em janeiro de 1974 por um Colégio Eleitoral composto por membros
do Congresso e delegados das Assembleias Legislativas estaduais. Tomou posse em
15 de março do mesmo ano.
Geisel assumiu o país num
descontentamento popular em relação ao regime. O “milagre brasileiro” se
esgotava e a concentração econômica prenunciava uma grave crise social. A insatisfação
dos brasileiros se expressou na ampla vitória do MDB nas eleições de 1974. De 87
deputados federais, a frente oposicionista passou para 165, enquanto a ARENA
teve sua bancada reduzida de 223 para 199 deputados. Esse resultado pareceu
comprometer a abertura política “lenta e gradual” pretendida pela governo Geisel.
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