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Poucos
anos depois da Independência das Treze Colônias inglesas, os habitantes de uma
colônia francesa pegaram em armas pela independência. Era Saint Domingue ocupada pelos franceses no século XVII e transformada, no século XVIII, numa
das maiores produtoras de açúcar do Caribe.
A
colônia tinha o perfil das ilhas escravistas da região, com uma minoria de
senhores, administradores e comerciantes brancos e uma imensa maioria de
escravos de origem africana: cerca de 85% de uma população de 800 mil
habitantes. Os quase 30 mil mestiços e negros libertos tinham papel importante
na economia local, dominando cerca de um terço dos negócios na ilha.
A
eclosão da Revolução Francesa causou enorme impacto. Em princípio, dividiu os
grandes senhores (grands blancs) entre os partidários do movimento e os leais
ao Antigo Regime. Depois, abriu espaço para as reivindicações dos mestiços e
libertos (affranchis), que exigiram enviar representantes aos Estados Gerais,
convocados pelo rei Luís XVI em Paris. Os grands blancs se opuseram, e Vincent
Ogé e Jean Baptista Chavanes lideraram uma insurreição contra os brancos, em
1790, na qual buscaram o apoio da Inglaterra, rival da França. Mas o golpe foi
abortado e os líderes da rebelião executados.
O
quadro se agravou com o levante geral dos escravos e quilombolas, liderados por
Boukman, Biassou e Jean-François, em 1791. Nessa altura, grands blancs e
affranchis se uniram e pediram a intervenção da metrópole, que se encontrava
dilacerada por conta da Revolução Francesa.
Ainda
assim, a França enviou 6 mil soldados em 1792, sob o comando do girondino
Santhonax, para conter a rebelião e defender a colônia de um eventual ataque
inglês. Para complicar a cena, os espanhóis resolveram retomar a ilha toda,
enviando tropas de Santo domingo.
Em 1793
o governo francês aboliu a escravidão nas colônias. Além disso, o comando-geral
do exército recaiu sobre o negro Toussaint-Louverture, que venceu os espanhóis
e dirigiu suas tropas contra as milícias dos grands blancs, inconformados com a
abolição da escravidão. Porém, Toussaint se conduziu de forma ambígua em todo o
processo, esforçando-se por ser leal à República francesa. Foi promovido, por
esse motivo, a general de brigada do exército francês. Mas, com a mudança do
quadro político na metrópole, adotou posições conservadoras, obrigando os
negros a voltar a trabalhar nas plantações. Sua tentativa de manter o poder a
qualquer preço descontentou à França e aos generais negros ao mesmo tempo.
Em
1802, após a ascensão de Napoleão Bonaparte (1799), o governo francês decidiu
restabelecer a escravidão em Saint Dominigue, e um poderoso exército de 60 mil
homens – comandados pelo general Leclerc, cunhado de Napoleão – foi enviado à
ilha. Toussaint-Louverture ainda conseguiu mobilizar suas tropas, agora contra
os franceses iniciando a luta pela independência. Mas sua liderança estava com
os dias contatos.
Nessa altura, a luta pela
independência de Saint Domingue e pela abolição da escravidão eram faces da
mesma moeda. Toussaint-Louverture foi capturado pelos franceses e morreu na
França, mas a luta prosseguiu sob o comando de Jean-Jacques Dessalines e
Alexandre Pétion, generais oriundos do exército quilombola.
Toussaint-Louverture |
Em 1804, o exército rebelde,
composto de africanos e seus descendentes, incluindo escravos, libertos e
quilombolas, triunfou sobre os franceses. Foi proclamada a independência,
escolhendo-se para o novo Estado o nome de Haiti (derivado de Ahti, nome
indígena da ilha antes da colonização). Muitos brancos do Haiti foram
massacrados ou expulsos; muitos fugiram deixando seus bens para trás.
Mas as lutas prosseguiram
internamente; Dessalines opô-se a outro general, Henri Cristoph, que em 1811
estabelecera o regime monárquico no norte da ilha, enquanto no sul vigorava uma
república. A população do Haiti mergulhava numa crise da qual jamais sairia,
perdendo o lugar de grande produtor de açúcar que ocupara até fins do século
XVIII.
Na América, o Haiti foi o único
caso de movimento no qual convergiram abolição da escravidão e proclamação da
independência, incluindo o massacre de brancos vencidos. Tornou-se, por isso
mesmo, um fantasma que assombrou por décadas senhores escravistas do
continente.
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