sábado, 18 de agosto de 2018

O fim da escravidão no Brasil


            O surto de modernização do Império contou também com a Tarifa Alves Branco (1844) e a Lei Eusébio de Queirós (1850).
         A Tarifa Alves Branco aumentou os impostos sobre cerca de 3 mil produtos importados. Esses produtos, que antes pagavam 15%, passaram a pagar de 30% a 60% de imposto nas alfândegas brasileiras. Com isso, aumentaram as rendas do governo. A Lei Eusébio de Queirós, por sua vez, proibiu a importação de escravizados, liberando capitais antes usados na sua reposição.

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         Os capitais oriundos do café e parte do capital gasto anteriormente na compra de escravizados passaram a ser aplicados no setor industrial, financeiro e de transportes, dinamizando, com isso, a economia. Foram inauguradas, então, dezenas de indústrias (de tecidos, chapéus, cervejas), várias companhias de seguros, navegação a vapor, estradas de ferro, bancos, empresas de mineração, de transportes urbanos e de gás. O Barão de Mauá, que tinha capital investido em muitas dessas empresas, projetou-se como o maior empresário do Império.
         Uma das principais iniciativas de Mauá foi a compra de uma pequena fundição e estaleiro com o nome de Ponta de Areia (1846), em Niterói, no Rio de Janeiro. Em pouco tempo, o estabelecimento já fabricava tubos para encanamentos, navios a vapor e trilhos de ferro. Outra importante empresa de Mauá foi a Companhia de Iluminação a Gás da cidade do Rio de Janeiro, que, a partir de 1854, passou a fornecer luz para as ruas e residências da capital do Império.
         A Inglaterra acumulou enormes lucros com o comércio de africanos pelo Atlântico durante os séculos XVII e XVIII, mas no século XIX passou a combater duramente o tráfico e a escravidão. O que teria levado o governo inglês a essa mudança de atitude?
         Primeiramente, os interesses da Inglaterra – país líder da Revolução Industrial – em ampliar os mercados consumidores de seus produtos. Com o fim da escravidão, o dinheiro gasto na compra de escravizados poderia ser utilizado na aquisição de manufaturados. Além disso, desde a abertura dos portos, a Inglaterra mantinha um intenso comércio com o Brasil, que se multiplicaria se os trabalhadores brasileiros passassem a receber salários.
         Acompanhe agora o cronograma sobre a questão pelo fim do tráfico de escravizados e a reação do governo brasileiro diante da pressão inglesa:

· 1827: A Inglaterra exigiu que o governo de Dom Pedro I extinguisse o tráfico negreiro no prazo de três anos, como condição para reconhecer a emancipação política do Brasil.
· 1831: Uma lei brasileira declara ilegal o comércio de escravizados para o Brasil. Essa lei, no entanto, permaneceu letra morta, isto é, sem valia.
· 1845: O Parlamento inglês aprovou a Bill Aberdeen, lei proposta pelo ministro inglês George Aberdeen que autorizava a Marinha inglesa a prender ou bombardear os navios negreiros, e a levar os contraventores para serem julgados na Inglaterra. A Bill Aberdeen foi uma represália à Tarifa Alves Branco, que elevava as taxas sobre os produtos importados e contrariava, assim, os interesses ingleses.

Externamente, a marinha inglesa reagia afundando navios suspeitos de contrabandear escravizados. Internamente, o aumento da entrada de africanos no Brasil atemorizava a elite, e o temor da africanização fazia com que ela acabasse por preferir o fim do tráfico.
Pressionado interna e externamente, o governo de Dom Pedro II aprovou em 4 de setembro de 1850 a Lei Eusébio de Queirós, que extinguiu o tráfico negreiro para o Brasil. Este passava a ser considerado crime, ato de pirataria, e como tal seria julgado. A proibição do tráfico, porém, colocava um problema para os proprietários escravistas: quem iria trabalhar para eles quando a escravidão fosse extinta? Em um país com muita terra disponível, como fazer para o trabalhador não se estabelecesse como posseiro?
Em resposta a esse problema, naquele mesmo ano (setembro de 1850), o governo imperial aprovou a Lei de Terras, que proibia o acesso à terra por doação ou ocupação. Só podia ser dono de uma terra quem a comprasse. Com isso, os imigrantes, os ex-escravizados e os homens livres e pobres ficavam excluídos do acesso à terra, cujos preços eram elevados demais para eles. A única alternativa, então, era trabalhar para os grandes proprietários ou comerciantes. E mais: ao transformar a terra numa mercadoria valiosa, essa lei favoreceu a concentração da propriedade nas mãos de uma minoria.
Com o fim do tráfico atlântico, aumentou a exigência de braços para as lavouras do Sudeste. Essa região passou então a comprar escravizados do Norte e Nordeste, onde a oferta de cativos era maior. Além do tráfico interno provincial, utilizou-se também do tráfico intraprovincial, ou seja, da transferência de cativos das áreas mais pobres para as mais ricas. Durante a vigência desses tipos de tráfico, negociaram-se cerca de 400 mil escravizados.
         Enquanto isso, no Parlamento, as poucas vozes que defendiam o aproveitamento do trabalhador nacional, livre ou liberto, eram abafadas pelo coro da maioria dos políticos do Império em favor da imigração europeia. A elite imperial referia-se aos africanos e a seus descendentes como indisciplinados, preguiçosos e desleais, e, portanto, inaptos para o trabalho livre. Diziam que só a imigração branca daria ao país cidadãos exemplares e, ao imperador, súditos fiéis.
Esse discurso que desqualificava a população afro-brasileira baseava-se em teorias produzidas na Europa, segundo as quais negros e mestiços eram “raças inferiores” e a “raça branca” era a única capaz de criar civilização. Essa visão racista da elite imperial fazia do europeu, especialmente o de pele mais clara e católico, o trabalhador preferido.
Outra força importante no processo que levou à extinção legal da escravidão foi o abolicionismo, movimento social liderado por pessoas de diferentes etnias e condições sociais e que se estendeu por quase todo o século XIX. Os abolicionistas divulgavam suas ideias por meio de jornais, grupos e associações e promoviam passeatas, comícios e outras manifestações públicas pelo fim da escravidão.
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André Rebouças 
Entre os abolicionistas havia profissionais liberais, como o engenheiro baiano André Rebouças; intelectuais, como o pernambucano Joaquim Nabuco; e membros das classes populares, como Luiz Gama.
Externamente, a escravidão começou a ser vista como “vergonha da humanidade” na segunda metade do século XVIII; essa condenação da instituição escravista por filósofos, como Diderot, e economistas, como Adam Smith, penetrou fortemente no Brasil somente na segunda metade do século XIX, quando as ideias e práticas liberais já tinham larga aceitação no país. Ao mesmo tempo, o fim da escravidão nos EUA, em 1865, acentuou o isolamento político do Brasil e deu mais um argumento para os abolicionistas brasileiros. Some-se a isso, ainda, o fato de vários governos estrangeiros pedirem, por meio de seus diplomatas, que D. Pedro II acabasse com a escravidão no Brasil.
Internamente, com o fim da Guerra do Paraguai, em 1870, a campanha abolicionista se popularizou e conquistou adeptos inclusive entre os oficiais do Exército, que passaram a ver com grande simpatia os negros que lutaram ao lado deles nos campos de batalha. Além disso, aumentavam as fugas de escravizados para os arredores de cidades que, por serem mais populosas, como Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo, favoreciam o anonimato.
Apesar das pressões externas e internas, o governo de D. Pedro II e a elite imperial defendiam a abolição lenta e gradual. E, com esse objetivo, aprovaram as chamadas leis abolicionistas. São elas:

Ø Lei do ventre livre: Lei nº 2. 040, de 28 de setembro de 1871
Art. 1º Os filhos de mulher escrava que nasceram no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre.
§ 1º Os ditos filhos menores ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão a obrigação de cria-los e trata-los até a idade de 8 anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de receber do Estado a indenização de 600 mil-réis, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. (...)

         Foram poucos os benefícios pela Lei do Ventre Livre. Muitos proprietários preferiam continuar se utilizando do trabalho das crianças a receber o dinheiro para libertá-las.
         Na década de 1880, a luta pela abolição ganhou corpo. Em 1883, foi fundada a Confederação Abolicionista, que assumiu a proposta de André Rebouças de abolição sem indenização e de doação de terras para os ex-escravos. Pernambuco viu surgir o Clube do Cupim, associação emancipatória que alforriava e defendia os escravos contrariando interesses centenários dos poderosos da província. Em São Paulo, o advogado Antônio Bento fundou uma organização secreta chamada Caifazes, também promovia e apoiava a fuga de escravizados. Essa organização protegeu os milhares de escravizados que fugiram das fazendas paulistas em direção os morros da cidade paulista de Santos, onde formaram o Quilombo do Jabaquara. Esse quilombo, surgido nos últimos anos do período imperial, chegou a reunir cerca de 10 mil quilombolas, entre homens, mulheres e crianças, e era liderado pelo crioulo sergipano Quintino de Lacerda. A população livre local escondia os fugitivos e facilitava a chegada deles ao alto dos morros.
         O governo de Dom Pedro II reagiu à onda abolicionista promulgando uma nova lei.

Ø Lei dos Sexagenários, de 28 de setembro de 1885: Declarava livres os escravizados com mais de 60 anos, mas exigia que eles continuassem trabalhando gratuitamente por mais três anos a título de indenização. Além disso, estipulava uma multa de 500 a 1. 000 réis para que protegessem ou acolhessem escravizados fugidos.

Ao contrário do que desejavam seus promotores, a Lei dos Sexagenários provocou a radicalização da luta contra a escravidão: os escravizados começaram a fugir em massa das propriedades de seus donos. Maquinistas colaboravam com as fugas retardando a marcha do trem para que os escravizados pudessem saltar e, escondidos entre as sacas de café, chegassem à cidade. Gráficos negavam-se a imprimir textos defendendo a escravidão. Os militares lançaram um manifesto, em 1887, afirmando que não mais fariam o papel de capitão do mato, isto é, não perseguiriam mais os fugitivos.

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Sob forte pressão popular, o governo imperial, exercido na época ela princesa Isabel, assinou a Lei Áurea, que declarava extinta a escravidão no Brasil, sem direito de indenização aos senhores e sem nenhuma reparação aos escravizados, que, segundo uma estimativa realizada um ano antes, somavam 723. 419 pessoas, pouco menos de 5% da população brasileira.
Politicamente a Lei Áurea contribuiu para o desgaste da monarquia: muitos fazendeiros escravistas, inconformados de não terem sido indenizados, aderiram à República. Por isso, foram chamados na época de republicanos de última hora.
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