O surto
de modernização do Império contou também com a Tarifa Alves Branco (1844) e a
Lei Eusébio de Queirós (1850).
A Tarifa Alves Branco aumentou os
impostos sobre cerca de 3 mil produtos importados. Esses produtos, que antes
pagavam 15%, passaram a pagar de 30% a 60% de imposto nas alfândegas
brasileiras. Com isso, aumentaram as rendas do governo. A Lei Eusébio de
Queirós, por sua vez, proibiu a importação de escravizados, liberando capitais
antes usados na sua reposição.
Os capitais oriundos do café e parte do
capital gasto anteriormente na compra de escravizados passaram a ser aplicados
no setor industrial, financeiro e de transportes, dinamizando, com isso, a
economia. Foram inauguradas, então, dezenas de indústrias (de tecidos, chapéus,
cervejas), várias companhias de seguros, navegação a vapor, estradas de ferro,
bancos, empresas de mineração, de transportes urbanos e de gás. O Barão de
Mauá, que tinha capital investido em muitas dessas empresas, projetou-se como o
maior empresário do Império.
Uma das principais iniciativas de Mauá
foi a compra de uma pequena fundição e estaleiro com o nome de Ponta de Areia
(1846), em Niterói, no Rio de Janeiro. Em pouco tempo, o estabelecimento já
fabricava tubos para encanamentos, navios a vapor e trilhos de ferro. Outra importante
empresa de Mauá foi a Companhia de Iluminação a Gás da cidade do Rio de
Janeiro, que, a partir de 1854, passou a fornecer luz para as ruas e
residências da capital do Império.
A Inglaterra acumulou enormes lucros
com o comércio de africanos pelo Atlântico durante os séculos XVII e XVIII, mas
no século XIX passou a combater duramente o tráfico e a escravidão. O que teria
levado o governo inglês a essa mudança de atitude?
Primeiramente, os interesses da Inglaterra
– país líder da Revolução Industrial – em ampliar os mercados consumidores de
seus produtos. Com o fim da escravidão, o dinheiro gasto na compra de
escravizados poderia ser utilizado na aquisição de manufaturados. Além disso,
desde a abertura dos portos, a Inglaterra mantinha um intenso comércio com o
Brasil, que se multiplicaria se os trabalhadores brasileiros passassem a
receber salários.
Acompanhe agora o cronograma sobre a
questão pelo fim do tráfico de escravizados e a reação do governo brasileiro
diante da pressão inglesa:
· 1827:
A Inglaterra exigiu que o governo de Dom Pedro I extinguisse o tráfico negreiro
no prazo de três anos, como condição para reconhecer a emancipação política do
Brasil.
· 1831:
Uma lei brasileira declara ilegal o comércio de escravizados para o Brasil. Essa
lei, no entanto, permaneceu letra morta, isto é, sem valia.
· 1845:
O Parlamento inglês aprovou a Bill Aberdeen, lei proposta pelo ministro inglês
George Aberdeen que autorizava a Marinha inglesa a prender ou bombardear os
navios negreiros, e a levar os contraventores para serem julgados na
Inglaterra. A Bill Aberdeen foi uma represália à Tarifa Alves Branco, que
elevava as taxas sobre os produtos importados e contrariava, assim, os
interesses ingleses.
Externamente,
a marinha inglesa reagia afundando navios suspeitos de contrabandear
escravizados. Internamente, o aumento da entrada de africanos no Brasil
atemorizava a elite, e o temor da africanização fazia com que ela acabasse por
preferir o fim do tráfico.
Pressionado
interna e externamente, o governo de Dom Pedro II aprovou em 4 de setembro de
1850 a Lei Eusébio de Queirós, que extinguiu o tráfico negreiro para o Brasil. Este
passava a ser considerado crime, ato de pirataria, e como tal seria julgado. A proibição
do tráfico, porém, colocava um problema para os proprietários escravistas: quem
iria trabalhar para eles quando a escravidão fosse extinta? Em um país com
muita terra disponível, como fazer para o trabalhador não se estabelecesse como
posseiro?
Em
resposta a esse problema, naquele mesmo ano (setembro de 1850), o governo
imperial aprovou a Lei de Terras, que proibia o acesso à terra por doação ou
ocupação. Só podia ser dono de uma terra quem a comprasse. Com isso, os
imigrantes, os ex-escravizados e os homens livres e pobres ficavam excluídos do
acesso à terra, cujos preços eram elevados demais para eles. A única
alternativa, então, era trabalhar para os grandes proprietários ou
comerciantes. E mais: ao transformar a terra numa mercadoria valiosa, essa lei
favoreceu a concentração da propriedade nas mãos de uma minoria.
Com
o fim do tráfico atlântico, aumentou a exigência de braços para as lavouras do
Sudeste. Essa região passou então a comprar escravizados do Norte e Nordeste,
onde a oferta de cativos era maior. Além do tráfico interno provincial,
utilizou-se também do tráfico intraprovincial, ou seja, da transferência de
cativos das áreas mais pobres para as mais ricas. Durante a vigência desses
tipos de tráfico, negociaram-se cerca de 400 mil escravizados.
Enquanto isso, no Parlamento, as poucas
vozes que defendiam o aproveitamento do trabalhador nacional, livre ou liberto,
eram abafadas pelo coro da maioria dos políticos do Império em favor da
imigração europeia. A elite imperial referia-se aos africanos e a seus
descendentes como indisciplinados, preguiçosos e desleais, e, portanto, inaptos
para o trabalho livre. Diziam que só a imigração branca daria ao país cidadãos
exemplares e, ao imperador, súditos fiéis.
Esse
discurso que desqualificava a população afro-brasileira baseava-se em teorias produzidas
na Europa, segundo as quais negros e mestiços eram “raças inferiores” e a “raça
branca” era a única capaz de criar civilização. Essa visão racista da elite
imperial fazia do europeu, especialmente o de pele mais clara e católico, o
trabalhador preferido.
Outra
força importante no processo que levou à extinção legal da escravidão foi o
abolicionismo, movimento social liderado por pessoas de diferentes etnias e
condições sociais e que se estendeu por quase todo o século XIX. Os abolicionistas
divulgavam suas ideias por meio de jornais, grupos e associações e promoviam
passeatas, comícios e outras manifestações públicas pelo fim da escravidão.
André Rebouças |
Entre
os abolicionistas havia profissionais liberais, como o engenheiro baiano André
Rebouças; intelectuais, como o pernambucano Joaquim Nabuco; e membros das
classes populares, como Luiz Gama.
Externamente,
a escravidão começou a ser vista como “vergonha da humanidade” na segunda
metade do século XVIII; essa condenação da instituição escravista por
filósofos, como Diderot, e economistas, como Adam Smith, penetrou fortemente no
Brasil somente na segunda metade do século XIX, quando as ideias e práticas
liberais já tinham larga aceitação no país. Ao mesmo tempo, o fim da escravidão
nos EUA, em 1865, acentuou o isolamento político do Brasil e deu mais um
argumento para os abolicionistas brasileiros. Some-se a isso, ainda, o fato de
vários governos estrangeiros pedirem, por meio de seus diplomatas, que D. Pedro
II acabasse com a escravidão no Brasil.
Internamente,
com o fim da Guerra do Paraguai, em 1870, a campanha abolicionista se
popularizou e conquistou adeptos inclusive entre os oficiais do Exército, que
passaram a ver com grande simpatia os negros que lutaram ao lado deles nos
campos de batalha. Além disso, aumentavam as fugas de escravizados para os
arredores de cidades que, por serem mais populosas, como Salvador, Rio de Janeiro
e São Paulo, favoreciam o anonimato.
Apesar
das pressões externas e internas, o governo de D. Pedro II e a elite imperial
defendiam a abolição lenta e gradual. E, com esse objetivo, aprovaram as
chamadas leis abolicionistas. São elas:
Ø Lei
do ventre livre: Lei nº 2. 040, de 28 de setembro de 1871
Art.
1º Os filhos de mulher escrava que nasceram no Império desde a data desta lei
serão considerados de condição livre.
§ 1º
Os ditos filhos menores ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de
suas mães, os quais terão a obrigação de cria-los e trata-los até a idade de 8
anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá
opção, ou de receber do Estado a indenização de 600 mil-réis, ou de utilizar-se
dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. (...)
Foram poucos os benefícios pela Lei do
Ventre Livre. Muitos proprietários preferiam continuar se utilizando do
trabalho das crianças a receber o dinheiro para libertá-las.
Na década de 1880, a luta pela abolição
ganhou corpo. Em 1883, foi fundada a Confederação Abolicionista, que assumiu a
proposta de André Rebouças de abolição sem indenização e de doação de terras
para os ex-escravos. Pernambuco viu surgir o Clube do Cupim, associação
emancipatória que alforriava e defendia os escravos contrariando interesses
centenários dos poderosos da província. Em São Paulo, o advogado Antônio Bento
fundou uma organização secreta chamada Caifazes, também promovia e apoiava a
fuga de escravizados. Essa organização protegeu os milhares de escravizados que
fugiram das fazendas paulistas em direção os morros da cidade paulista de
Santos, onde formaram o Quilombo do Jabaquara. Esse quilombo, surgido nos
últimos anos do período imperial, chegou a reunir cerca de 10 mil quilombolas,
entre homens, mulheres e crianças, e era liderado pelo crioulo sergipano
Quintino de Lacerda. A população livre local escondia os fugitivos e facilitava
a chegada deles ao alto dos morros.
O governo de Dom Pedro II reagiu à onda
abolicionista promulgando uma nova lei.
Ø Lei
dos Sexagenários, de 28 de setembro de 1885: Declarava livres os escravizados
com mais de 60 anos, mas exigia que eles continuassem trabalhando gratuitamente
por mais três anos a título de indenização. Além disso, estipulava uma multa de
500 a 1. 000 réis para que protegessem ou acolhessem escravizados fugidos.
Ao
contrário do que desejavam seus promotores, a Lei dos Sexagenários provocou a
radicalização da luta contra a escravidão: os escravizados começaram a fugir em
massa das propriedades de seus donos. Maquinistas colaboravam com as fugas
retardando a marcha do trem para que os escravizados pudessem saltar e,
escondidos entre as sacas de café, chegassem à cidade. Gráficos negavam-se a
imprimir textos defendendo a escravidão. Os militares lançaram um manifesto, em
1887, afirmando que não mais fariam o papel de capitão do mato, isto é, não
perseguiriam mais os fugitivos.
Sob
forte pressão popular, o governo imperial, exercido na época ela princesa
Isabel, assinou a Lei Áurea, que declarava extinta a escravidão no Brasil, sem
direito de indenização aos senhores e sem nenhuma reparação aos escravizados,
que, segundo uma estimativa realizada um ano antes, somavam 723. 419 pessoas,
pouco menos de 5% da população brasileira.
Politicamente
a Lei Áurea contribuiu para o desgaste da monarquia: muitos fazendeiros
escravistas, inconformados de não terem sido indenizados, aderiram à República.
Por isso, foram chamados na época de republicanos de última hora.
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