quinta-feira, 3 de março de 2016

O ENSINO DE HISTÓRIA DURANTE A DITADURA MILITAR

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO EDUCACIONAL ALFA





O ENSINO DE HISTÓRIA DURANTE A DITADURA MILITAR







MOISÉS DE PAULA RODRIGUES










CARATINGA
2015








CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO EDUCACIONAL ALFA



O ENSINO DE HISTÓRIA DURANTE A DITADURA MILITAR




MOISÉS DE PAULA RODRIGUES


Dissertação apresentada à Coordenação do curso de pós-graduação de Ensino de História, da Pontifícia Universidade à Uniandrade, como requisito parcial para a obtenção do Grau de pós-graduado.



CARATINGA
2015







Sumário
























Resumo


Este trabalho acadêmico tem como finalidade discorrer sobre os mecanismos adotados pelo governo militar no sentido de concretizar a manipulação ideológica, empregando métodos específicos no sistema educacional, mais precisamente no ensino de história. Além disso, foi realizado um debate concernente aos decretos-leis criados objetivando modificar a funcionalidade da disciplina com o intuito de viabilizar a formação de uma geração caracterizada pela postura acrítica diante dos acontecimentos políticos. A deficitária formação dos professores, juntamente com medidas arbitrárias e repressoras contribuiu para orquestrar um aparelho de governo onde inexistia um espaço para contestação e debates acerca do regime militar. Na tentativa de promover a manipulação diante do sistema de ensino, os materiais oferecidos aos discentes, mais precisamente os livros didáticos, possuíam um conteúdo marcado pela exaltação de grandes líderes do passado, uma história onde os principais fatos eram narrados de uma maneira amorfa e os valores patrióticos eram abordados incisivamente. Qualquer manifestação contrária ao que estava sendo perpetrado pelo governo era reprimida pelos órgãos dirigentes, dentro dos princípios da Doutrina de Segurança Nacional. Inexistia um espaço substantivo para o debate e o desenvolvimento do pensamento crítico entre o corpo discente e, os professores, sobremaneira, eram sumariamente surpreendidos por movimentos hostis por parte do governo militar. Por fim, a presente pesquisa apresentará os desdobramentos do golpe civil-militar e suas consequências nas instituições de ensino e precisamente na disciplina história.









Introdução

            O presente trabalho tem como objetivo analisar os mecanismos adotados pela ditadura militar no sentido de modificar o sistema educacional e, precisamente o ensino de história, estabelecendo normas e princípios com o intuito de legitimar o regime político vigente. O impacto gerado na educação após o golpe civil-militar foi abordado de uma forma sistemática, cuja repercussão foi visível em todas as áreas da produção de conhecimento.
            O segundo capítulo da pesquisa realizou um debate sobre a metodologia aplicada ao ensino de história. A perspectiva positivista foi adotada de uma maneira sistemática durante governo autoritário, cuja aplicação era desprovida de criticidade e sem um posicionamento de contestação diante dos acontecimentos vivenciados. Além disso, em seu percurso até se estruturar como disciplina acadêmica, a história passou por diversos problemas quanto a sua funcionalidade e autenticidade científica.
            Vale enfatizar que, no decorrer da pesquisa, foram abordados os mecanismos adotados no sentido de utilizar o sistema educacional, mais precisamente o ensino de história, como elemento essencial no sentido de se efetivar a manipulação ideológica. Deve-se enfatizar que houve uma abordagem sistemática sobre os decretos-leis criados com a finalidade de se instrumentalizar a manipulação e o controle sobre as diretrizes curriculares das instituições de ensino.
            O regime político caracterizado como uma ditadura, que teve início no Brasil em abril de 1964, desarticulou os movimentos de liberdade de expressão e luta pela igualdade de direitos sociais e civis. A sociedade se deparou com um fenômeno político marcado pelo controle absoluto dos meios de comunicação e ausência de alternância do poder público. Durante vinte e um anos a população perdeu seus direitos fundamentais, como de se expressar livremente diante dos fatos acorridos no momento.
            Diante da repressão política, a ditadura militar modificou o sistema educacional com a finalidade de efetivar a manipulação e associar a imagem do governo a noções como progresso, desenvolvimento e avanço na qualidade de vida da sociedade. Com isso, a história passou por um processo de desarticulação de sua funcionalidade, voltada para o posicionamento crítico diante dos acontecimentos políticos.
            Por fim, foi realizada uma discussão concernente às características dos livros didáticos adotados durante o período de vigência da ditadura militar. O conteúdo do livro, voltado para a exaltação de grandes líderes do passado, foi discorrido associando o fato com a finalidade de se concretizar a manipulação concretizada na educação.
Capítulo 1: O ensino de história
           
Diante de uma perspectiva contextualizada, a história do ensino de história passou por diversas fases em sua fundamentação teoria e metodológica. Já na esfera do poder político constituído, a disciplina foi comumente utilizada com a finalidade de manter a ordem social vigente, como manobra no sentido de implantar uma ideologia e atender interesses particulares.
            No caso específico do Brasil, a história enfrentou diversos empecilhos em sua trajetória até se consolidar como disciplina, com grade curricular definida. Autoridades representantes do poder público defendiam a ideia de que a história não era considerada uma ciência, mas tão somente uma área do conhecimento desprovida de caráter científico, impossibilitando, sobremaneira, a sua implantação no sistema educacional.
            Vale enfatizar que os princípios positivistas provocaram a desarticulação do ensino de história. Em outras palavras, a narração linear dos fatos, a biografia dos grandes líderes da nação e a enumeração acrítica dos principais acontecimentos do país; contribuíram para associar a história à noção de disciplina desprovida de embasamento técnico-científico.
            Entretanto, ainda no período regencial, após a criação do colégio D. Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro, a história foi incorporada à grade curricular do corpo discente a partir da sexta série.  Porém, o material oferecido aos professores não era traduzido para o português, obrigando-os a recorrer ao conteúdo francês para ministrarem suas aulas.
                Outro obstáculo encontrado concernente à implantação da história como disciplina acadêmica consiste na oposição sistemática de autoridades do poder constituído. Um exemplo dessa oposição foi do senador paulista Paulo Egídio de Oliveira que afirmou:

“A História não é uma ciência, senão, eu pergunto: qual a sua fenomenologia? A História não tem fenômenos, ou, por outra, todos os fenômenos pertencem à História, que é a trama que serve para prova de todos os conhecimentos humanos de todas as ciências. (...) Frente a tantos e variáveis caminhos que se lhe apresentavam, não conseguindo identificar um caminho a seguir ou oferecer uma sugestão alternativa, e o que era para ele de extrema importância- “um método positivo”-, preferiu optar pela não introdução da História da Civilização no Estado de São Paulo, como parte do programa do ensino público”.[1]
            Contudo, algumas transformações foram instrumentalizadas em meados de 1920, principalmente com a escola dos annales francesa. A importância do movimento referido consiste em sua reformulação metodológica e ampliação do objeto de estudo da história, atribuindo-lhe uma fundamentação científica consistente. Vale ressaltar que áreas como filosofia, sociologia, antropologia, arqueologia, dentre outras, foram comumente empregadas no sentido de aprofundar o estudo de história e essenciais no sentido de conceder um suporte ao objeto de estudo.
            Com isso, métodos científicos, adotado pelos franceses, como a história oral, a história quantitativa, a história iconográfica elevaram a disciplina fundamentalmente como uma área do conhecimento, com um aparato científico peculiar. Dessa forma, a história alcançou passou a ser vista como uma importante ferramenta no sentido de compreender o comportamento humano na sociedade em que está inserido e sua capacidade modificadora da mesma. Ou seja, os historiadores passaram a ser caracterizados como críticos contundentes do sistema político-ideológico estabelecido.
            Portanto, essa postura crítica diante de fatos vivenciados no cotidiano, provoca incomodação nas autoridades do poder público constituído. Todavia, deve-se enfatizar que a história passou a ser considerada uma importante ferramenta no sentido de se implantar valores e ideais de uma forma vertical, ou seja, de uma maneira hierarquizada. O mecanismo incorporado pelos órgãos dirigente é modificar as diretrizes impetradas no sistema educacional, utilizado como um instrumento essencial na manutenção do regime político outorgado.


Capítulo 2: O ensino de história durante a ditadura militar

            Em abril de 1964 teve início um período na história do Brasil marcado pela repressão e falta de liberdade de expressão. Utilizando o argumento de um suposto projeto dos comunistas, liderados pelo presidente João Goulart, de tomar o poder, os militares instalaram um novo modelo político no país, tendo o amparo de setores dirigentes da nação. Mediante um golpe civil-militar, orquestrado pelos setores conservadores do país, o presidente constitucionalmente eleito, Jango (como era conhecido pelas camadas populares), foi expulso do cargo e, a posteriori, exilado na Argentina.
            Após a concretização do golpe, os militares projetaram um aparato de governo caracterizado pela hierarquização e ausência de participação popular no governo. Objetivando estabelecer a ordem no país e expulsar os comunistas, considerados subversivos, foi criado a DSN (Doutrina de Segurança Nacional). Inspirado em princípios norte-americanos, a função de tal doutrina consistia em proteger o país diante do “perigo” representado pela figura dos comunistas.
            A partir dos fatos ocorridos em 1964, os militares sistematizaram uma série de mecanismos no sentido de proteger o regime político estabelecido. Além disso, iniciou-se a disseminação de noções de nacionalismo e patriotismo veiculado nos meios de comunicação, associando a imagem do governo à modernização e industrialização. Variados instrumentos propagandísticos foram criados com a finalidade de manipular a opinião pública a favor do governo.
            Com a finalidade de incrementar o desenvolvimento econômico do país, considerado predominantemente agrário, o governo criou uma série de medidas no sentido de aumentar a escolaridade da população. Porém, deve-se destacar que o Estado assumiu o compromisso de incentivar a industrialização, investindo, sobremaneira, em cursos profissionalizantes e na preparação técnica de mão de obra que atendesse à demanda. Existia a preocupação em diminuir a procura pelos cursos superiores e aprimorar a formação técnica voltada para a industrialização.

Perceberam que para realizarem suas intenções era necessário aumentar o grau de escolaridade da população, sem, no entanto, aumentar a procura pelo já sufocado ensino superior. A fórmula encontrada para evitar esse aumento da demanda foi adotar a partir de 1969 a exigência do vestibular para que houvesse o ingresso na Universidade. Para evitar o aumento da demanda das vagas universitárias teriam que incentivar a formação profissional já em nível do ensino médio através da instituição e incentivo do ensino profissionalizante, proporcionando assim, a opção de finalização dos estudos, mas com uma formação profissional definida e valorizada. [2]

            O regime militar utilizou o sistema de ensino intensamente com o objetivo de orquestrar a manipulação ideológica e promover a aceitação do governo diante das classes sociais. Vale enfatizar que o sistema de ensino foi reformulado em consonância com a Doutrina de Segurança Nacional. Em outras palavras, o corpo discente entrava em contato com um conteúdo caracterizado pelas distorções e sistematicamente voltado para a modificação da imagem do Estado.
            No que concerne ao ensino de história especificamente, deve-se ressaltar que a disciplina passou por um processo de reformulação metodológica, tendo como finalidade inviabilizar o desenvolvimento do senso crítico e a capacidade de contestar o sistema político vigente. Os princípios positivistas foram sistematizados e implantados nos currículos e programas de ensino. A narração de acontecimentos e a biografia de grandes heróis foram aspectos marcantes nos materiais dispensados aos alunos, culminando numa nítida defasagem em seu processo de ensino-aprendizagem.

A educação teria papel importante nesse sentido, ela teria que ser formadora de mão-de-obra para o setor industrial sem a necessidade de formar cidadãos críticos a ponto de poderem contestar as decisões governamentais. Por isso, não haveria a necessidade das ciências humanas formadoras de senso crítico. Pois gerava uma negação de conteúdo crítico na formação geral do educando. Em relação à negação da formação geral ao educando, Selva Guimarães Fonseca nos coloca essa questão afirmando que o objetivo seria proporcionar uma educação que levasse em conta os ideais do Conselho de Segurança Nacional cujo objetivo era controlar e reprimir as opiniões a fim de evitar ou eliminar qualquer resistência ao regime autoritário em vigor. [3]
           
As diretrizes curriculares adotadas durante a ditadura militar tinham como finalidade promover o avanço da industrialização em detrimento da formação humana integral do corpo discente. As áreas humanas, responsáveis pelo desenvolvimento do pensamento crítico, foram desarticuladas e os docentes passaram a sofrer perseguição. Ou seja, o mecanismo repressivo adotado pelo governo empreendeu medidas de combate a movimentos considerados contrários à ordem previamente estabelecida. O corpo docente passou a ter que obedecer a hierarquia dos poderes e a ordem pública, seguindo os princípios norteadores da DSN.
No dia 18 de abril de 1969 foi criado o decreto-lei nº 547 que autorizou o funcionamento e organização dos cursos de licenciatura curta. Com isso, os professores concluíam sua formação acadêmica em menos tempo com relação às outras áreas (principalmente técnicas). Como consequência imediata, os docentes tiveram uma defasagem significativa em seu processo formativo, perdendo a capacidade de se posicionar criticamente diante dos acontecimentos políticos.
Os professores de história, disciplina caracterizada pela criticidade, tornaram-se meros transmissores de conhecimento, ou seja, perderam sua capacidade de contestação. Em outras palavras, os docentes assumiram uma posição de “proletários da educação” e, sobremaneira, os alunos não passavam por um processo formativo crítico, tornando-se cidadãos passivos diante dos acontecimentos.

No início do ano de 1969, amparado pelo Ato Institucional nº5, de dezembro de 1968, o governo, através do Decreto-lei nº547, de 18 de abril de 1969, autoriza a organização e o funcionamento de cursos profissional superiores de curta duração. Ao admitir e autorizar habilitações intermediárias em nível superior para atender às “carências do mercado”, o Estado revela ser desnecessária uma formação longa e sólida em determinadas áreas profissionais, quais sejam, as licenciaturas encarregadas de formar mão-de-obra para a educação. “Enquanto isso, outras áreas de formação profissional mantiveram os mesmos padrões de carga horária e duração”. [4]

            Um dos mecanismos adotado pelo governo militar foi a implantação dos Estudos Sociais na grade curricular dos alunos que, de uma maneira superficial, formava em apenas um ano e meio os chamados “professores polivalentes”. Dessa forma, os professores eram habilitados a ministrarem aulas de história e geografia. A finalidade do governo autoritário com tal medida consistia na tentativa de ajustar o indivíduo à ordem, tornando-o submisso diante do autoritarismo impetrado no governo do período. A consequência da aplicação dos Estudos Sociais foi a formação de professores incapacitados para exercerem suas função de uma maneira qualificada e, sobremaneira, houve um nítido prejuízo no processo de ensino aprendizagem do corpo discente.
            Vale enfatizar que a lei 5692/71, criada pelos órgãos dirigentes da ditadura militar, concedeu ao governo a exclusividade na elaboração do currículo de formação dos professores. Com isso, o processo de aprendizagem dos professores era permeado por uma metodologia positivista, que ressaltava os grandes heróis da nação, uma narração linear de fatos considerados relevantes e uma postura acrítica e amorfa dos docentes e discentes diante dos objetos de estudo.
             Esse processo, caracterizado pela perseguição e repressão dos órgãos dirigentes do governo, foi responsável pela formação de uma geração conhecida como “deixa para lá”, ou seja, inexistia, por parte dos estudantes e professores, um posicionamento contestatório diante das medidas arbitrárias do Estado. Portanto, o sistema educacional foi um instrumento eficaz no processo de manipulação da grande massa e da produção de conhecimentos, que exaltava os feitos do governo e forjava um passado glorioso e sem representatividade diante das camadas sociais.

“O programa curricular imposto durante o Regime Militar, com a Reforma do Ensino de 1971 impunha um Ensino diretivo, acrítico, no qual a História aparecia como uma sucessão linear de fatos considerados significativos, predominantemente políticos e militares, com destaque para os “grandes nomes”, os espíritos positivos que conduzem a História”. [5]

            Uma das peculiaridades do sistema de ensino do período, mais precisamente do ensino de história, foi a elaboração de um currículo voltado para despertar o sentimento patriótico na nação. Noções como nacionalismo e civismo, que faziam parte do quadro diretivo da DSN, eram vinculadas nas escolas e programas educacionais. Vários desfiles e manifestações de amor à bandeira nacional eram organizados periodicamente com a finalidade de promover o amor e respeito ao país.
            O corpo discente era controlado e manipulado intensamente, pois, juntamente com o aparato propagandístico orquestrado pelos militares, o sistema de ensino era sistematiza com a finalidade de promover a imagem do governo. Vale ressaltar que os slogans do período, como “Brasil, ame-o ou deixe-o”, “Ninguém segura este país”, dentre outros, faziam parte de um aparato que, juntamente com a cultura e educação, consistia em associar a ditadura militar a noções como progresso, desenvolvimento e avanço social.
            Portanto, o objetivo do governo era, sobremaneira, inserir no aluno a noção de magnificência da pátria e limitar os questionamentos inerentes à situação do país. Os discentes não podiam desenvolver nenhum pensamento crítico diante da situação em que se encontravam, pois estavam inseridos num sistema em que eram forçados a obedecer a hierarquia dos poderes. O programa curricular do curso de história da rede pública de ensino era uma ferramenta fundamental no sentido de legitimar as ações do governo.
            Vale enfatizar que a sociedade viveu um período marcado pela perseguição e repressão em todas as esferas da sociedade civil. Além do controle dos meios de comunicação, os estudantes e professores eram sumariamente vigiados. Qualquer manifestação apontada como subversiva era investigada e os responsáveis acusados de ameaçarem a ordem nacional. A Doutrina de Segurança Nacional servia como uma ferramenta no sentido de aprimorar o controle total sobre os intelectuais e estudantes do país.

“A ditadura implantada com o movimento militar de 1964 desfechou também um golpe nas diferentes experiências de ensino. Escolas fechadas, professores e alunos presos e respondendo a processos-crimes foram algumas das formas usuais de tratamento por parte dos novos donos do poder”. [6]

            Enfim, a disciplina de história, como parte integrante do sistema de ensino, pode ser apontada como uma ferramenta essencial no processo de manipulação do pensamento e do senso crítico da sociedade. O programa de ensino ofertado durante o período foi orquestrado para despertar no corpo discente o sentimento de nacionalismo e de valorização da pátria. A população, acostumada com a manipulação, não despertava para a real situação em que se encontravam.

Capítulo 3: Os materiais didáticos dos alunos durante a ditadura militar.

            O presente capítulo tem como objetivo analisar as peculiaridades do material dispensado aos alunos durante a ditadura militar. Além disso, foi realizada uma abordagem concernente às características do material, suas intenções, anseios e aspirações. O foco girou em torno dos conteúdos presentes nos livros didáticos, ofertados aos alunos do sistema público de ensino.
            Antes de chegar aos alunos, os livros didáticos passavam por um processo de análise por parte dos órgãos dirigentes. Em outras palavras, o conteúdo presente nos materiais ofertados aos discentes passava por uma meticulosa análise, cuja finalidade era aferir se havia mensagens de caráter subversivo.
            Com isso, os livros de história eram elaborados somente para exaltar os grandes feitos do passado, uma narração linear e acrítica dos acontecimentos. Os alunos decoravam perguntas e respostas e interagiam com textos tendenciosos, modificando fatos importantes do país com a finalidade de atender interesses particulares.

O método mais preciso, dentro do interesse desse regime era o controle, através desse, poder-se-ia construir uma nação de acordo com os propósitos de quem estava no poder, no caso desse estudo os militares. O controle é uma forma de manter a ordem para evitar insurreições. Era preciso controlar, e uma das formas desse processo era através dos livros didáticos que uniformizavam o ensino dentro das intencionalidades do governo. [7]

            Os discentes passavam por um processo de ensino-aprendizagem caracterizado pela defasagem e sem um senso crítico aprofundado. Vale enfatizar que os recursos iconográficos eram sumariamente utilizados pelos autores dos livros, associando noções de amor à bandeira e à pátria brasileira. Ou seja, o nacionalismo era uma ferramenta utilizada constantemente ao se elaborar um livro didático, exaltando o respeito e a cidadania. A finalidade do regime militar era tão-somente garantir a manutenção da ordem, controlando com rigor todas as camadas da sociedade.
            Com a finalidade de legitimar o regime político vigente, nos livros didáticos continham textos relatando a ameaça comunista. Os golpistas de 1964 eram caracterizados como salvadores da nação, cuja missão seria resgatar o país dos comunistas ateus, que estavam propícios a tomar o poder e destruir a família brasileira. Inexistia um espaço adequado para o debate e o respeito ao pensamento crítico e epistemológico, ou seja, os alunos não podiam debater sobre os fatos apresentados.
            A preservação da segurança e da ordem, baluartes da Doutrina de Segurança Nacional, eram noções indispensáveis dos materiais oferecidos aos discentes. O sistema de ensino foi construído com a finalidade de atender aos interesses privados do grupo que ocupava o poder de uma forma ilegal. Por isso, o patriotismo deveria ser abordado com os alunos de uma maneira incisiva, controlando todo movimento de subversão e de ameaça à ordem estabelecida.
            Outra estratégia adotada pelos militares consistia na associação com princípios religiosos. Em outras palavras, os livros didáticos abordavam textos de caráter religioso, cujo objetivo era condicionar a postura dos alunos à princípios inerentes à religião, evitando, sobremaneira, o surgimento de movimentos classificados como subversivos e nocivos à ordem e à estrutura familiar.

Por isso, incorporar conteúdos relacionados à moral nos livros didáticos foi uma das maneiras encontradas pelos militares em manter a ordem no país e assim se manterem no poder. Para eles a moral de uma pessoa estava relacionada com as suas ações, portanto, era importante enfatizar a relação com Deus, porque se enquadrando numa religião evitava-se o mal. Saber quais eram seus deveres perante a sociedade, manter-se dentro da moralidade, buscando Deus, evitava, segundo as pessoas que estavam no poder, manifestações críticas da população com relação ao governo/conduta dos militares, pois a moral diz respeito a seguir normas, enquanto a ética é o próprio questionamento moral. [8]

            Enfim, as cartilhas, documentários, livros didáticos, dentre outros materiais ofertados aos alunos, faziam parte de um aparato orquestrado com a finalidade de promover a legitimação do golpe militar de 1964, que retirou o presidente eleito democraticamente da presidência. Para concretizar tal objetivo, os militares iniciaram um processo de transformações do sistema educacional, mais precisamente do ensino de história, disciplina conhecida pelo posicionamento crítico diante do cenário político vigente.
            Deve-se ressaltar que uma série de métodos e práticas pedagógicas foram impostos aos docentes, além de vários decretos-leis que objetivavam outorgar a manipulação e o controle exercidos sobre a produção de conhecimento. A formação do professor e o seu desempenho em sala de aula foram significativamente afetados, mediante o controle total sobre a conduta dos profissionais de ensino. E, por outro lado, os alunos tinham uma formação cognitiva incompleta e desprovida de subsídios críticos diante da sociedade que o cercava.

Conclusão


            Um dos mecanismos consistentes de manipulação da grande massa e instrumento fundamental de controle da produção de conhecimentos epistemológicos é o sistema de ensino. Diante de uma metodologia específica, moldada segundo os interesses dos dirigentes do país, a educação é controlada sistematicamente no sentido de modificar a imagem do governo.
            Com a implantação do golpe militar de 1964, os militares orquestraram um aperfeiçoado aparato no sentido de legitimar o regime político vigente. Os valores patrióticos e nacionalistas, em simbiose com noções religiosas, foram transmitidos aos discentes através dos materiais didáticos oferecidos. Diante de tal perspectiva, a imagem do governo militar foi manipulada sumariamente.
            Além disso, o processo de ensino-aprendizagem dos alunos era incompleto e caracterizado pela ausência de debates e posicionamento crítico diante dos acontecimentos. Os dispositivos constitucionais orquestrados pelos militares promoveram a completa manipulação diante dos sistemas de ensino. Por um lado, os professores passavam por uma formação desprovida de uma pedagogia epistemológica e, em contrapartida, os discentes não desenvolviam um pensamento de contestação diante dos acontecimentos.
            Diante de uma perspectiva pedagógica, o ensino de história passou por problemas inerentes ao seu conteúdo programático. Em outras palavras, a narração sucessiva dos acontecimentos considerados relevantes, a biografia dos grandes heróis da nação e as atividades decorativas ofertadas aos alunos, provocou uma desarticulação do verdadeiro objetivo da história considerada uma disciplina acadêmica. Os ideais propagados pelos militares foram perpetrados no sistema de ensino, principalmente no que concerne aos objetos de estudo da história.
            No que diz respeito aos materiais ofertados aos profissionais da educação, deve-se ressaltar que as instituições de ensino eram moldadas em conformidade com os princípios outorgados pelo militares. Manifestações patrióticas eram preparadas nas escolas com a finalidade de valorizar o nacionalismo e os sentimentos de amor à nação. Além disso, havia a associação entre a religião e os valores fundamentais da construção da cidadania dentro dos parâmetros da DSN. Qualquer movimento considerado subversivo era sumariamente investigado pelos órgãos repressores e, os intelectuais e estudantes, controlados de uma forma incisiva.










Bibliografia

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação. 2. ed. rev. e atual. São
Paulo: Ed. Moderna, 1996, 255 p.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional. Lei nº 5692, de 11 de agosto de 1971. Pedagogia em foco. Disponível em: Acesso em: 15 abril 2014.

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FONSECA, Selva Guimarães. Caminhos da história ensinada. Campinas: Papirus, 1993.

GERMANO, J.W. Estado militar e educação no Brasil (1964-1985). São Paulo: Cortez; Campinas: Unicamp, 1993.

LIMA E FONSECA, Thais Nívia de. O ensino de História do Brasil: concepções e apropriações do conhecimento histórico (1971-1980). In: CERRI, Luiz Fernando (org). O Ensino de História e a Ditadura Militar. 2ª ed. Aos Quatro Ventos, 2007.

MARTINS, Maria do Carmo. Currículo, cultura e ideologia na ditadura militar brasileira: demarcação do espaço de atuação do professor. In: CERRI, Luiz Fernando. (org). O Ensino de História e a Ditadura Militar. 2ª ed. Aos Quatro Ventos, 2007.

NADAI, Elza. O Ensino de História no Brasil: trajetória e perspectiva. Revista
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ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil: 1930 - 1973. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.

SCHIMIDT, Maria A. e CAIINEL, Marlene. Ensinar história. São Paulo: Scipione, 2004.







[1] GERMANO, J.W. Estado militar e educação no Brasil (1964-1985). São Paulo: Cortez; Campinas: Unicamp, 1993, pág. 76

[2] ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil: 1930 - 1973. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 1991. Pág. 267.
[3] FONSECA, Selva Guimarães. Caminhos da história ensinada. Campinas: Papirus, 1993. Pág. 25
[4] FONSECA, Selva Guimarães. Op cit. Pág. 65.

[5] LIMA E FONSECA, Thais Nívia de. O ensino de História do Brasil: concepções e apropriações do conhecimento histórico (1971-1980). In: CERRI, Luiz Fernando (org). O Ensino de História e a Ditadura Militar. 2ª ed. Aos Quatro Ventos, 2007. Pág. 57
[6] NADAI, Elza. O Ensino de História no Brasil: trajetória e perspectiva. Revista Brasileira de História. Vol. 13, nº 25/26. São Paulo: AMPUH/Marco Zero, 1993.
[7] CHAUI. Marilena. Convite a Filosofia. 12 ed. São Paulo: Ed Atica, 2002. Pág. 440
[8] SCHIMIDT, Maria A. e CAIINEL, Marlene. Ensinar história. São Paulo: Scipione, 2004.

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