sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

A República do “café com leite” no Brasil

        Proclamada em 15 de novembro de 1889, a República nascia no Brasil como resultado de um movimento de cúpula, como uma espécie de “revolução pelo alto” controlada desde o primeiro momento pelos militares e pelas elites agrárias.
         Dessa forma, o novo regime não se preocupou em promover mudanças, mesmo que superficiais, na estrutura econômica do país. A grande propriedade rural monocultora e voltada para a exportação foi mantida como base da economia. Ao mesmo tempo, conservou-se a estrutura política sustentada no mandonismo dos coronéis do interior e das oligarquias agrárias. Por toda parte, o traço distintivo da jovem República continuou sendo a exclusão social, política e econômica de grande parte da população.

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Movimento do Exército na proclamação da República.

         Herdada do período colonial, a escravidão foi uma das bases sobre as quais se assentava o Império. A partir de 1870, porém, ela começou a ser contestada por amplos setores da sociedade. Profissionais liberais, estudantes, artesãos, pequenos empresários e até sacerdotes e militares passaram a se manifestar contra o trabalho escravo em um dos mais empolgantes movimentos sociais de nossa história: a campanha abolicionista.
         A pressão sobre o governo crescia, e como resposta foi aprovada, em 1885, a Lei Saraiva-Cotegipe, ou Lei dos Sexagenários, pela qual eram libertados os escravos com mais de 60 anos. A questão abolicionista, porém, parecia estar longe de ser resolvida. A escravatura, entretanto, parecia estar com os dias contados. Em 1887, as fugas de escravos se intensificaram nas fazendas de São Paulo, e o governo, preocupado em proteger os interesses dos donos das terras, tentou mobilizar o exército para capturar os revoltosos. Com discursos na Assembleia Geral, Joaquim Nabuco conciliou os militares a se rebelarem contra a função de capitães do mato que o governo queria impor a eles. Deu certo, pois logo depois, em nota oficial dirigida ao governo, o Exército pediu que fosse liberado desse tipo de ação.
         Aos poucos, o ideal republicano se difundiu pelo país, conquistando adeptos entre as camadas médias da população urbana. O movimento ganhou importante impulso, porém, quando duas crises abalaram o regime imperial: a Questão Religiosa e a Questão Militar.
         Além desses, a participação do Brasil na Guerra contra o Paraguai também foi desastrosa para o Império, pois além de contribuir para difundir ideias republicanas e abolicionistas, estimulou também a formação do chamado “espírito de corpo” entre os membros do Exército. Esse “espírito” levava-os a pensar como grupo, ou como corporação dotada de qualidade e valores que a colocavam acima das ambições dos políticos profissionais, chamados depreciativamente por eles de “casaca”.
         Insatisfeitos com a política do Império, os militares passaram a se considerar mais preparados que os civis para cuidar dos interesses da nação. A partir daí, nascia a ideia de “missão salvadora” a que o Exército estaria destinado. Sob essa óptica, soldados e oficiais deixavam de ser meros instrumentos para garantir a segurança da nação e tornavam-se “cidadãos fardados”, comprometidos com o futuro da pátria. Essas ideias justificavam para eles a intervenção militar na vida política do país.
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Benjamin Constant
         No dia 11 de novembro, Benjamin Constant, Quintino Bocaiuva e Rui Barbosa, entre outros líderes, reuniram-se com o marechal Deodoro da Fonseca, tentando convencê-lo a aderir à conspiração. Com todo o seu prestígio nos meios militares, Deodoro seria a garantia de que o Exército permaneceria unido em torno da causa republicana.
         Amigo de dom Pedro II, Deodoro hesitou. Enquanto isso, surgiram alguns boatos de que a prisão tinha sido decretada e de que haveria profundas mudanças no Exército. Diante dos rumores, Deodoro decidiu liderar o movimento para depor o ministério de dom Pedro II.
         Na manhã de 15 de novembro de 1889, tropas rebeladas sob o comando do marechal Deodoro prenderam o visconde de Ouro Preto e outros ministros. Em seguida, desfilaram pelo centro da cidade, sempre com o marechal à sua frente. Nas ruas, a população carioca foi surpreendida com a parada militar, sem saber direito o que estava acontecendo. Naquela mesma tarde, os revoltosos proclamaram a República e, à noite, as lideranças republicanas reuniram-se para formar o Governo Provisório.
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Marechal Deodoro da Fonseca.
         Proclamada a República, os líderes do movimento compuseram um Governo Provisório, sob a chefia do marechal Deodoro da Fonseca, um antigo monarquista e velho amigo de dom Pedro II. Deodoro compôs então o seu ministério com civis e militares de destaque no movimento republicano, como Quintino Bocaiuva (Relações Exteriores) e Benjamin Constant (Guerra). Além deles, havia ex-monarquistas, como Rui Barbosa (Fazenda), e representantes da poderosa aristocracia cafeeira de São Paulo, como o fazendeiro Campos Sales (Justiça). Em linhas gerais, como era de esperar, o ministério representava as principais elites econômicas e políticas do país.
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Quintino Bocaiuva.
         As medidas iniciais do Governo Provisório foram publicadas no Diário Oficial do dia 16 de novembro de 1889. O país passava a ser uma República Federativa com o nome de Estados Unidos do Brasil, e as províncias eram transformadas em estados. Adotou-se uma nova bandeira, com o lema positivista Ordem e Progresso. Poucos dias depois, foi decretada a separação entre o Estado e a Igreja, o que significa que funções que até então eram exercidas pela Igreja passariam, a partir desse momento, a ser exercidas por repartições públicas. Ao mesmo tempo, para elaborar uma Constituição para a República, o governo convocou eleições para uma Assembleia Nacional Constituinte.
         No comando da política econômica, a principal preocupação de Rui Barbosa era promover a industrialização do país, o que só seria possível se houvesse recursos para investir na produção. Como faltava dinheiro, a saída era o governo criar linhas de crédito e aumentar o volume de papel-moeda em circulação.
         Por isso, em janeiro de 1890, Rui Barbosa deu início a uma política financeira que permitia a alguns bancos emitir dinheiro quase sem controle estatal.
         Essa política possibilitou maior volume de negócios em todo o país: apenas no ano de 1890, fundaram-se 313 novas empresas. A maioria delas, porém, tinha como meta a venda de ações para obter lucros rápidos e fáceis no mercado financeiro. Entre 1890 e 1891, o aumento da quantidade de dinheiro em circulação provocou inflação e febre especulativa na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Essa febre recebeu o nome ENCILHAMENTO, pois lembrava a jogatina das corridas de cavalo.
         Não demorou muito para que uma séria crise econômica abalasse o país. No início de 1891, além da inflação, ocorreu acentuada queda no preço das ações, causando prejuízos e falências. A política de emissão de dinheiro e a expansão do crédito, que caracterizaram o encilhamento, duraram dois anos, até o início do governo de Floriano Peixoto, que assumiu o compromisso de estabilidade da moeda.
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Rui Barbosa.
         Convocada logo nos primeiros dias do novo regime, a Assembleia Constituinte só deu início a seus trabalhos em novembro em 1890. Três meses depois, a Constituição, inspirada na Carta estadunidense, estava pronta. Revisado por Rui Barbosa, o texto constitucional instituía uma República federativa presidencialista, delegando maior autonomia aos estados. Depois de votada pela Assembleia, a Constituição republicana entrou em vigor em 24 de fevereiro de 1891.
         No dia seguinte, a Assembleia elegeu o marechal Deodoro da Fonseca presidente da República. Para a vice-presidência foi eleito outro militar, o marechal Floriano Peixoto. Segundo a Constituição, os presidentes seguintes deveriam ser escolhidos por voto direto, podendo participar das eleições apenas homens com mais de 21 anos e alfabetizados. A seguir, a Assembleia Constituinte transformou-se em Congresso Nacional, constituído pelo Senado e pela Câmara dos Deputados.
         Desde o início de seu governo, Deodoro enfrentou forte oposição no Congresso. Os parlamentares acusavam-no de autoritário e, em agosto de 1891, tentaram aprovar uma lei limitando os poderes da Presidência. Em 3 de novembro, Deodoro fechou o Congresso e decretou estado de sítio. Essa reação autoritária desencadeou uma rebelião liderada pelo almirante Custódio de Melo. Com os navios de guerra apontando seus canhões para a cidade do Rio de Janeiro, os revoltosos exigiam a renúncia do presidente. Sem apoio suficiente e disposição para reagir, Deodoro deixou o cargo em 23 de novembro de 1891.
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Marechal Floriano Peixoto.
         Empossado na Presidência, o marechal Peixoto entregou o ministério da Marinha a Custódio de Melo e tentou governar com o apoio do Partido Republicano Paulista, o PRP. O clima político, no entanto, não era de conciliação. Floriano Peixoto contava com a simpatia de setores radicais e nacionalistas das camadas médias urbanas – os chamados JACOBINOS -, mas era considerado autoritário pelas elites rurais. Em fevereiro de 1893, a crise entrou em sua fase mais aguda, com a eclosão da Revolução Federalista, no Rio Grande do Sul. Os rebeldes exigiam o afastamento do governador gaúcho, o positivista Júlio de Castilho, e a diminuição dos poderes do presidente, com a instituição do parlamentarista.
         Sete meses depois de iniciada a Revolução Federalista, o almirante Custódio de Melo, que nesse meio-tempo havia se afastado do ministério e de Floriano, declarou-se novamente em estado de rebeldia. O marechal precisava apagar, agora, dois focos de incêndio: a rebelião dos gaúchos e a Revolta da Armada, na baía de Guanabara.

         Para aumentar a força de seus adversários. Floriano passou a acusa-lo de monarquistas (o que, pelo menos em parte, era verdadeiro). Dessa forma, ele pôde aparecer como o defensor da República. Conseguiu o apoio do Exército, do PRP e dos presidentes (atuais governadores) dos estados. Ao mesmo tempo, mobilizou grande parte da população carioca. Em abril de 1894, Floriano conseguiu sufocar a Revolta da Armada contando com uma nova frota de navios obtida com urgência no exterior. E no ano seguinte, já sob o governo do paulista Prudente de Morais, a Revolução Federalista chegou ao fim.

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